O senador e pré-candidato à presidência da Colômbia, Miguel Uribe Turbay, um dos líderes da oposição ao governo de esquerda do país, foi alvo de um atentado em Bogotá.
Atingido por cerca de seis disparos pelas costas durante um evento, ele foi submetido a uma cirurgia e seu estado de saúde é considerado crítico.
Um adolescente de 15 anos foi preso em flagrante como o autor dos disparos. Ele foi contido pela equipe de segurança do senador e chegou a ser espancado por espectadores.
O assassino foi encaminhado para ser examinado em um hospital sob custódia policial.
Ao ser detido, o ele teria oferecido entregar os contatos de quem deu a ordem para o ataque:
"Deixe-me dar-lhe os números. Mas se você não me deixar ir... Deixe-me dar-lhe os números", respondeu após ser questionado pelos seguranças.
As autoridades colombianas montaram uma força-tarefa para encontrar os mandantes do atentado.
O governo está oferecendo uma recompensa de aproximadamente R$4 milhões por informações que levem aos responsáveis.
Embora tenha condenado o atentado, a forma como o presidente Gustavo Petró se pronunciou gerou indignação na Colômbia e no exterior.
Em um pronunciamento em vídeo, cercado por membros de seu governo, Petro causou polêmica ao dar uma ênfase especial à proteção do atirador menor de idade:
"A primeira coisa que defendemos é a própria vida. A vida da vítima, que está em boas mãos, nas quais confiamos, e a vida do assassino, que é um menor de idade, um menino. As leis e as normas nos obrigam a proteger o menino por ser menino, porque, se não cuidamos dos meninos da pátria, não teremos pátria."
A declaração foi vista como uma relativização da gravidade do ato e uma demonstração de pouca empatia com a vítima, que, segundo sua esposa, está "lutando pela vida".
A primeira reação de Petro, em uma postagem na rede social X, também foi alvo de críticas.
Ele não mencionou o nome de Uribe e se referiu a ele de forma vaga, como "o filho de uma mulher árabe em Bogotá, que já havia sido assassinada".
A mãe do senador era a jornalista Diana Turbay, assassinada pelo cartel de Medellín em 1991.
A oposição colombiana reagiu. A parlamentar Katherine Miranda, da Aliança Verde, classificou o discurso de Petro como "ridículo e patético".
Outros, como Juan Espinal, do partido de Uribe (Centro Democrático), afirmaram que a postura do presidente reflete um "governo desgovernado".
A ex-senadora Ingrid Betancourt, que também foi vítima de sequestro por guerrilheiros no passado, criticou Petro por ter dito uma frase em árabe para Uribe:
"Não era o momento certo", afirmou.
O Secretário de Estado americano, Marco Rubio, atribui o ataque à retórica da esquerda colombiana:
"Essa é uma ameaça direta à democracia e o resultado da violenta retórica esquerdista vinda dos mais altos escalões do governo colombiano… O presidente Petro precisa voltar atrás na retórica inflamada e proteger as autoridades colombianas."
O atentado contra Miguel Uribe Turbay se insere em um padrão de escalada da violência contra figuras políticas nas Américas e em outras partes do mundo.
Exemplos são facada sofrida por Bolsonaro em 2018, as tentativas de assassinato contra Trump e ao assassinato do candidato Guillermo Lasso no Equador.
Segundo especialistas em segurança e ciência política, esse tipo de ataque raramente é um ato isolado, mas costuma ser o resultado de um processo de radicalização e desumanização do adversário.
Marcos Degaut, doutor em Segurança Internacional, escreveu em coluna para a Gazeta do Povo, que a violência política é uma estratégia que busca paralisar ou eliminar a oposição.
O objetivo é enviar uma mensagem clara de que a intransigência ideológica pode transbordar para a agressão física.
Para que isso aconteça, segundo Degaut, grupos radicais doutrinam seus membros em técnicas de "desengajamento moral":
“Os terroristas são doutrinados dentro de um espectro que varia do político-ideológico ao religioso e treinados em técnicas de desengajamento moral e de desumanização, que os levam a se julgarem diferentes do resto da humanidade e portadores de uma verdade universal.”
Nesse processo, o oponente político deixa de ser visto como um ser humano com ideias diferentes e passa a ser retratado como um obstáculo a ser removido.
O especialista afirma que esses grupos se refiram a suas vítimas como "porcos" ou "cães", termos que anulam sua humanidade. Essa desumanização:
"remove o ônus de matar pessoas inocentes e permite que a violência seja empregada indiscriminadamente contra todos que são percebidos como ‘inimigos’".
A violência, dentro dessa lógica, deixa de ser um tabu e se torna uma ferramenta "positiva" e transformadora.
Essa tática não é nova. Marcos Degaut lembra que, historicamente, diversos grupos radicais utilizaram a violência como método.
“Historicamente, diversos movimentos de esquerda, desde os anarquistas do final do século XIX, com sua ‘propaganda pela ação’, originária das ideias do “revolucionário” russo Mikhail Bakunin – que incluía atentados e assassinatos de chefes de Estado para inspirar a revolução – até as guerrilhas urbanas do século XX, adotaram a violência como tática central.”
O próprio presidente Petro participou do grupo guerrilheiro M-19, a organização pegou em armas para defender sua visão marxista até a década de 1990.
O cientista político João Victor Guedes-Neto, professor da FGV e doutor pela University of Pittsburgh, complementa essa análise com o conceito de "polarização afetiva".
Para ele, muitas democracias vivem um cenário de hostilidade, ódio e desconfiança entre partidários de campos ideológicos. Isso serve como pano de fundo para a legitimação da violência.
Guedes-Neto afirma que contextos polarizados tornam comum o fenômeno da desumanização:
“Isso é evidenciado nas interações online e offline, em que discursos de ódio e agressões são justificados pela percepção de que o outro é menos digno de respeito e direitos. Tratar o outro como um animal é um passo para a violência.”
Segundo Guedes-Neto, a polarização atual muitas vezes não é puramente ideológica, mas baseada em uma identidade de grupo – o "nós contra eles" e o "tudo ou nada".
O pesquisador Shanto Iyengar demonstra que a identidade com um partido pode se tornar mais importante do que as próprias ideias defendidas.
Esse fenômeno, alimenta percepções falsas sobre os rivais, permite sua desumanização e, por consequência, legitima atos de violência.
Para ambos os especialistas, a consequência direta da exaltação da violência é a renúncia ao diálogo e à própria política.
A violência se torna um substituto para a negociação e o debate, corroendo as fundações do Estado de Direito e da convivência civilizada.
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