Entenda as principais diferenças entre esquerda e de direita em relação à política, a origem e a finalidade destes conceitos. Veja também o problema de distinguir as partes políticas em apenas dois pólos. Saber corretamente os limites e o alcance destas conceituações pode evitar confusões e rótulos impensados.
Para nos orientar nesse entendimento, a Brasil Paralelo recebeu Adriano Gianturco, professor de Ciência Política do IBMEC-MG, PhD em Teoria Política e Econômica (Universitá di Genova), Mestre em Relações Internacionais (Universitá di Torino) e Bacharel em Ciência Política e Relações Internacionais (Universitá Roma Tre).
Segundo ele nos explica, é muito simplório falar apenas em direita e em esquerda, sendo uma dicotomia binária sem força para abranger a complexidade política de cada país em um determinado momento.
Confira o vídeo com a explicação:
Também levamos em consideração as explicações do professor Olavo de Carvalho, do jornalista Percival Puggina e do professor Dennis Prager, da Prager University.
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A história dos termos esquerda e direita tem origem na Revolução Francesa, em 1789. Na Assembleia Nacional Constituinte, os girondinos que eram moderados e conciliadores, sentaram-se à direita do orador, ou seja, do presidente que conduzia a assembleia.
À esquerda sentaram-se os simpatizantes da revolução, os jacobinos, considerados mais exaltados e radicais, afirma Norberto Bobbio no livro Esquerda e direita: razões e significados de uma distinção política.
Debatia-se sobre a revolução, sobre uma nova Constituição, destronar o rei, acabar com a monarquia e resolver a crise em que a França se encontrava. Os girondinos à direita não queriam uma mudança drástica, eram favoráveis ao rei e queriam conservar as coisas com prudência.
Mas os jacobinos queriam uma revolução radical, mudar totalmente a forma como a sociedade se organizava, esperando melhorar tudo por meio de seus ideais realizados.
Edmund Burke e Thomas Paine
Para ilustrar a diferença de pensamento de cada lado, o professor Adriano Gianturco exemplificou qual a diferença entre esquerda e direita usando estes dois nomes.
Edmund Burke é considerado o pai do conservadorismo moderno. Ele foi um filósofo irlandês que criticou a Revolução Francesa em seu ensaio “Reflections on the Revolution In France” (Reflexões sobre a Revolução na França). Profeticamente, ele temia que o ideal revolucionário levasse o terror à França, o que de fato aconteceu.
Segundo o Livro Negro da Revolução Francesa, aproximadamente 40.000 pessoas foram mortas em 10 anos. O método era a guilhotina e o ambiente era a praça pública. Este era o preço a ser pago por não se aderir à revolução.
Já Thomas Paine, político britânico entusiasta da Revolução Francesa, acreditava que a história humana deveria recomeçar. Seu entendimento era que nossa razão permitia que a vida social fosse reconstruída a partir do zero. Bastaria um novo planejamento teórico, ideológico e político.
Burke não defendia isso. Ele não queria radicalizar e começar do zero. Como ele explicou, o contrato social em que vivemos envolve todo o conjunto de acontecimentos do passado. Ele não queria que a tradição fosse esquecida. Assim, por prudência e respeitando os conhecimentos herdados dos antigos, ele se opunha aos processos revolucionários.
Como o exemplo de Burke e Paine ilustra qual a diferença entre esquerda e direita?
O primeiro defende que os processos de mudanças sociais acontecem levando-se em conta a antiguidade, o conhecimento adquirido. Ele prefere ser prudente e conservar aspectos que funcionam.
Já o segundo defende que é preciso uma revolução que reinicie todas as coisas, que recomece de uma forma totalmente nova, ainda que sejam formas ainda não testadas. Normalmente são ideias, ideologias, que se espera que resolvam os problemas vigentes.
Logo, vincula-se à esquerda um pensamento mais reformista, progressista, revolucionário. À direita vincula-se o que envolve o conservadorismo.
No entanto, as definições de direita e esquerda que começaram claras não permaneceram assim. A complexidade das novas situações políticas e mesmo a diferença com que os grupos em países diferentes são vistos, em diferentes momentos, tornou mais imprecisa a categorização em dois simples polos.
Qual a diferença entre esquerda e direita
A diferença entre esquerda e direita pode ser resumida da seguinte maneira: as pessoas que se dizem de direita acreditam em um melhor funcionamento da sociedade quando o governo é limitado e os indivíduos possuem mais poder.Ser de esquerda é estar mais preocupado com a coletividade, com o grupo e não com a individualidade, afirma John Rawls, doutor em Filosofia e professor da Universidade de Harvard.
Embora a definição seja muito carente para contextualizar e realmente definir grupos políticos, tanto no Brasil quanto em outros países, alguns traços gerais permanecem e servem como indicadores.
É possível ver diferenças claras entre o que é ser “direitista” e o que é ser “esquerdista”, considerando os pontos-chave apresentados e mais outros. Estes são os que veremos a seguir.
Mesmo vendo estas diferenças, reforçamos que são rótulos muito simples de aplicar. São aspectos políticos e não uma definição científica. São rótulos que não abarcam completamente as decisões das pessoas ou dos grupos políticos.
O que é ser de esquerda?
Pintura representando Karl Marx.
Ser de esquerda é defender um Estado maior. Neste caso, defende-se que o Governo deve estar presente em todos os aspectos da vida social. Por exemplo, a educação infantil, o regimento interno das empresas, a economia, as assistências sociais de qualquer natureza e, até mesmo, os limites da liberdade de culto, diz Michael Walzer, doutor em ciências políticas pela Universidade de Cambridge, em seu livro Esferas da Justiça: Uma Defesa do Pluralismo e da Igualdade.
Neste caso, não deve haver nenhum poder que seja equivalente ao do Estado, nem os pais na família, nem os CEO’s das empresas, nem os proprietários das escolas particulares, nem os líderes religiosos nas igrejas e, finalmente, nem mesmo a consciência humana individual.
Para um típico progressista de esquerda, um governo reduzido e fraco, limitado ao essencial gera as seguintes consequências:
Os mais pobres serão explorados pelos mais ricos. Sem um governo mediando as relações entre empregados e seus patrões, haverá injustiças, exploração e abuso da parte mais fraca;
Serão formados monopólios econômicos. Com empresas livres para decidir sobre todos os rumos de seus negócios, sem algum controle estatal, poderão surgir monopólios que dominam a vida das pessoas ou que impeçam outras de terem oportunidades de crescimento;
Crises econômicas podem se formar. Um exemplo tradicional que contesta a liberdade econômica desenfreada é o da crise de 1929;
A meritocracia que fixa desigualdades. O problema de que cada um, por si mesmo, desenvolva-se e mereça algo pelo que produziu é que alguns são mais desfavorecidos socialmente. Eles podem ser relegados para sempre a uma condição pior, por não terem forças para sair de um determinado estado sem a ajuda do governo.
Ser de esquerda é estar mais preocupado com a coletividade, com o grupo e não com a individualidade. As causas que exigem lutas são causas sociais, de grupos, tribos, minorias.
Em alguns momentos da história, os governos socialistas, exemplo de alinhamento à esquerda, sacrificaram pessoas em prol do bem do partido e da causa como um todo.
Também é comum encontrar no lado esquerdo um número considerável de pessoas que sustentam que a verdade não é objetiva, que ela é relativa. Pensadores como Karl Marx ensinaram a pensar que não existe bem ou mal, verdade ou mentira.
Há o que favorece a causa da revolução e o que não a favorece. Se ajuda a revolucionar, é bom. Se não ajuda, é mal.
Esquerdistas veem os problemas da sociedade e defendem a criação de um governo forte para resolvê-los.
Qual é o lado da direita?
Foto da primeira-ministra Margaret Thatcher discursando.
O lado da direita, em geral, são as pessoas que acreditam em um melhor funcionamento da sociedade quando o governo é limitado. O Estado deve ser menor e cuidar apenas do essencial, restringindo-se às necessidades mais absolutas das pessoas, afirma Francis Fukuyama, professor de Ciência Política com doutorado em Harvard, no livro O Fim da História e o Último Homem.
Exemplos de necessidades assim seriam a defesa nacional, a garantia de abastecimento de mantimentos e de energia elétrica, água, etc. Neste pensamento, o governo é o último recurso, acionado apenas quando as pessoas não podem fazer nada por si mesmas, como família, associação, igrejas e afins.
Para um típico conservador, como o filósofo Roger Scruton, se o governo cresce no poder e começa a dominar as esferas sociais como os liberais de esquerda defendem, veremos inevitavelmente as seguintes consequências:
A corrupção aumenta. O poder e dinheiro acumulados e centralizados vão gerá-la. As pessoas no governo venderão influência para obter ganhos pessoais e políticos. Já as de fora buscarão comprar essa influência e favores. Na África e na América Latina, por exemplo, a corrupção do governo tem sido o maior fator que impede as nações de progredir;
A liberdade individual diminui. A liberdade individual é menos importante para a esquerda do que para a direita. Observando os desdobramentos de forma lógica, quanto maior o controle do governo sobre a vida das pessoas, menor a liberdade que elas têm;
Governos sempre crescendo, no sentido de poder sobre a vida das pessoas, ou reduzem seu tamanho, ou entram em colapso econômico. Esse tipo de governo que se agiganta depende muito dos novos pagadores para pagar os pagantes anteriores. O dinheiro dos benefícios sociais vem dos impostos públicos e quando não há mais dinheiro, o sistema vai à falência;
Os impostos aumentam periodicamente. Como consequência do aumento de impostos, as pessoas deixam de trabalhar ou trabalham menos. O número de contratação diminui e as empresas deixam o país, aumentando o desemprego. Por que isso acontece? Porque o Estado precisa de uma quantia alta para manter ativos os programas sociais que julga necessários para combater as desigualdades entre as pessoas;
Governos grandes produzem altos déficits e dívidas também crescentes. Afinal, quanto mais dinheiro o Estado distribui, mais dinheiro as pessoas demandam dele. Neste caso, ou diminuem ou as contas começam a não fechar. Uma tendência geral é que as pessoas sustentadas por outras, ou pelo poder público no caso, trabalhem menos e o país não gere tanta riqueza como um país no qual as pessoas trabalham porque dependem disso para o próprio sustento. Isto leva à próxima consequência;
O caráter nacional fica ferido. Com liberdades diminuídas e com uma visão de um Estado que tem o dever de “dar” as coisas, as pessoas não se dedicam ao trabalho, não se dedicam ao processo criativo, a concorrência diminui e os produtos se tornam escassos e regulados.
Uma forte razão para se opor a um governo tão forte que influencie a vida das pessoas está na defesa da individualidade. A direita defende a liberdade de cada indivíduo, mais do que defende um grupo identificado, um partido, uma minoria ou algo parecido. Defende a menor minoria do mundo: cada pessoa especificamente.
À direita, encontramos com mais frequência uma valorização e defesa de valores morais tradicionais, sejam eles familiares, religiosos ou éticos e morais. Os pensadores tradicionalmente vinculados à direita acreditam que existe uma verdade objetiva, que não é relativa.
Para eles, a verdade não é moldada de acordo com a necessidade da revolução social, mas sim de acordo com os fatos da realidade.
Direitistas veem os problemas da sociedade e defendem que cada indivíduo se aprimore, organize-se e resolva o que dá conta, buscando ajuda quando o problema está além de seu alcance por meio de grupos intermediários até chegar ao Estado.
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