O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, prometeu que cortaria suas emissões de carbono pela metade até 2030 e até 2070 tornaria o país neutro em carbono durante a COP26, em 2021.
A imprensa e os ativistas ficaram encantados. Uma reportagem da Bloomberg disse que o compromisso ousado da Índia mudou o tom da conferência.
Quando Modi voltou para casa. A energia que mais cresceu na Índia foi a do carvão mineral, justamente a fonte que mais emite carbono na atmosfera.
Em 2025, o país bateu o recorde da produção de carvão. Foram 1 bilhão de toneladas, mais do que os EUA e a Europa produzem juntos.
Esse caso mostra que os políticos mais habilidosos entenderam que o principal evento climático é o momento de dizer o que os ambientalistas querem ouvir.
É hora de revelar verdades inconvenientes sobre a COP. Que conferência é essa? Como surgiu? E no que se transformou?
Tudo começou em 92, no Rio de Janeiro com a Eco 92, a cúpula da Terra. O mundo inteiro se reuniu para discutir o meio ambiente.
Foi ali que nasceu a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre a mudança do clima, FCC, uma espécie de Constituição climática assinada por quase todos os países.
Na convenção surgiu a ideia de fazer um encontro anual batizado de conferência das partes, mais conhecido como COP.
Eduardo Lunardelli Novais, é administrador e ex-secretário do clima e relações internacionais do Ministério do Meio Ambiente, explica como funciona o evento:
“Essas convenções têm burocracias permanentes junto à ONU que trabalham 365 dias por ano e anualmente é feita uma assembleia das partes, que seria como se fosse um plenário, a instância suprema decisória dessas convenções, que são as convenções das partes, chamadas de COP”.
Daniel Vargas, professor da FGV e ex-secretário de desenvolvimento sustentável, explica que a questão se baseava principalmente em conter a emissão de carbono dos países do Norte Global:
“Essas emissões de gases do efeito estufa eram resultado de um processo de industrialização que aconteceu sobretudo nos países do Atlântico Norte.”
Ele também destaca que havia uma preocupação em desenvolver a economia dos países mais pobres:
“Para combater esse problema, precisamos separar um espaço de liberdade para que os países mais pobres possam crescer e se desenvolver, não deixando assim que essa ocupação da atmosfera por gases produzidos no norte sirvam como uma espécie de proibição para novos países mais pobres avançarem.”
O objetivo era acompanhar o progresso e negociar compromissos coletivos. Afinal, não adianta um país reduzir suas emissões de carbono se outros aumentam.
A primeira edição da conferência aconteceu em 1995, em Berlim. Dois anos depois nasceu o protocolo de Kyoto em 1997.
“Os membros desta convenção determinaram que o problema de climático era global. As responsabilidades eram diferentes, porque o estoque de gases de efeito estufa foi acumulado ao longo de séculos, portanto, países ricos tiveram uma responsabilidade maior do que os países de desenvolvimento”, explicou Lunardelli.
Mas não deu certo. O Senado americano não ratificou a decisão da COP. O Canadá deixou em 2011 e poucos países chegaram perto de cumprir o protocolo.
Por esse motivo, em 2015 foi assinado o acordo de Paris, que essencialmente substituiu o acordo anterior, e determinou que todos os países teriam que estabelecer suas metas de emissões.
Dessa vez, quase todos os países do mundo assumiram metas de reduzir as emissões, cada um dentro das suas possibilidades.
Eduardo Novais destaca que o debate climático deixou de ser sobre os poluidores históricos do Norte global e passou a mirar os países mais pobres:
“O debate climático hoje é cada vez mais um debate sobre como o uso da terra nos países mais pobres. O acordo de Paris não trata dessa responsabilidade histórica e propõe-se a encontrar soluções para o problema na determinação da diminuição de fluxos futuros.”
O resultado é que basicamente nenhum país está no caminho para cumprir essas metas até 2030.
Os negociadores na COP não têm o poder de ditar os rumos do mundo. Na verdade, eles podem criar protocolos e acordos, mas quem de fato faz regras e leis são os parlamentos nacionais.
Enquanto não inventarmos substitutos bons e baratos para gasolina, gás natural ou formas de produzir cimento, aço, concreto e fertilizantes, sem emitir tanto carbono, dificilmente as decisões da COP vão ter algum impacto no mundo.
Narloch foi um dos enviados da Brasil Paralelo para cobrir a COP30, em Belém. Clique aqui para acompanhar o evento.
Como a COP se transformou em um “espetáculo verde”?
No começo, as conferências eram pequenas, reuniam diplomatas e alguns poucos ativistas ambientais.
Com o tempo, a COP se transformou em um evento realizado para as câmeras e para render boas imagens na imprensa.
A COP 27 aconteceu em 2022 no Egito. A conferência foi anunciada como última chance de salvar o planeta, mas milhares de pessoas emitiram carbono para chegar até lá.
Foram 33 000 participantes, o maior número da história até então. A viagem de boa parte dessas pessoas foi bancada com dinheiro público dos países mais pobres do mundo.
A Nigéria, por exemplo, chegou a enviar mais de 1.400 representantes. Assim como em Belém, a COP do Egito também teve esses problemas de hospedagem.
No ano seguinte, a COP 28 de Dubai ultrapassou o Egito. Reuniu cerca de 90.000 pessoas, mais do que um Maracanã lotado.
Virou o maior evento climático da história e o mais contraditório. Só o Brasil levou mais de 1.300 pessoas, perdendo pros Emirados Árabes.
A COP 28 foi tão inchada que precisou acontecer em dois locais distintos dentro do Expo City Dubai, com áreas exclusivas para governos, empresas e ONGs.
Eduardo Novais comenta que os participantes desses eventos alternam entre cargos políticos, postos em organizações internacionais e em ONGs:
“As pessoas que participam de posições de autoridade nos diversos países fazem parte de grupos de interesse. Ora ocupam cargos de autoridade governamental, ora fazem parte da burocracia multilateral, ora fazem parte de organizações não governamentais.”
Dessa maneira, eles garantem acesso a “bilhões de dólares a fundo perdido” entregues para ONGs.
Os interesses econômicos por trás das COPs
“Hoje a COP é um espetáculo, um show, serve para trânsito de interesses como qualquer feira de negócios. Para fechamento de negócios, apresentação de propostas ligadas às autoridades ali presentes, burocratas da ONU ou as autoridades nacionais dos diversos países”, explicou Novais.
Até mesmo ambientalistas já perceberam que a COP não tem muita função além desse narcisismo climático.
Em 2024, 428 cientistas, ativistas, acadêmicos e até chefes de Estado publicaram uma cartapedindo mudanças profundas no formato das conferências climáticas da ONU.
Eles pediram reuniões menores, mais frequentes, mais voltadas às soluções e sem tantos lobistas.
Na COP 28, aquela de Dubai, mais de 2400 representantes da indústria de óleo e gás receberam credenciais para circular nas negociações climáticas.
A BBC revelou que autoridades dos Emirados Árabes planejavam usar o papel de anfitriões da COP 28 em benefício da estatal de óleo e gás, a Adinc.
Entre os planos, havia conversas sobre parcerias com a China para a exploração de gás em Moçambique, no Canadá e na Austrália.
Teve um caso em que os próprios organizadores da COP atuaram como lobistas. Em 2024, integrantes de uma ONG ambientalista se passaram por investidores de uma empresa fictícia de Hong Kong.
Eles disseram que estavam interessados em patrocinar a COP 29 e também se mostraram dispostos a fechar contratos de óleo e gás com a Socar, a estatal do Azerbaijão.
O coordenador da COP 29, que também era vice-ministro de energia do Azerbaijão, Elmor Soltanov, foi gravado pela ONG disposto a fechar contratos de exploração de petróleo.
Ou seja, por um lado ativistas protestam para acabar com os combustíveis fósseis, por outro, políticos e empresários negociam contratos de exploração de combustíveis.
O ministro Aldo Rebelo comenta que desde a conferência de Estocolmo, há uma tentativa de congelar o poder econômico, mantendo o desenvolvimento concentrado em poucos países:
"O Brasil tinha um embaixador de muito prestígio que se contrapôs e disse: ‘Não, só tem discussão do meio ambiente se tiver direito ao desenvolvimento’. Ele teve embates com o embaixador americano e dizia isso: ‘Primeiro vocês congelaram o poder militar com o tratado de não proliferação de armas nucleares… e agora vocês chegaram no congelamento do poder econômico.’”
Daniel Vargas destaca que a partir desse momento ocorreu uma mudança na forma como o discurso ambientalista se organizava, passando a mirar os países pobres:
“A partir daí o problema não é mais a energia e a indústria dos ricos, mas a produção agrícola e pecuária dos pobres… O que vamos ver na COP 30, pelo que tudo indica, será uma negociação sobre como tratar a agricultura em uma agenda climática que estabelece restrições, obrigações e punições.”
O poderoso lobby verde dentro da COP30
O lobby mais poderoso da COP não é o do óleo do gás ou das grandes empresas que querem parecer sustentáveis, mas o lobby do que ele chama de “burocracia climática”.
A expressão se refere às ONGs, institutos e fundações que orbitam em torno da agenda do clima.
Parecem ativistas climáticos, mas tem como objetivo garantir mais dinheiro para os fundos de adaptação.
A maior parte desses recursos não vai para proteger florestas, mas para manter escritórios e salários das próprias ONGs.
Essa engrenagem teria transformado a COP em um mercado de influência. Os ativistas estariam disputando quais organizações ganham mais recursos dos fundos de crise climática.
Ele afirma que, em diversos casos, esse dinheiro vai parar bem longe do clima, usando como exemplo o que aconteceu com o Inflation Reduction Act, do governo Biden.
O programa foi vendido como o maior pacote climático da história dos Estados Unidos, com mais de US$100 bilhões para energia limpa, redução de emissões e justiça climática.
Mas em 2023 foi descoberto que parte do dinheiro acabou em causa sem nenhuma relação com o meio ambiente.
É uma rede de ONGs que organizou, por exemplo, uma marcha em Washington com cartazes como:
“Palestina livre é questão de justiça climática”;
“Nosso governo financia o genocídio”; e
“Só uma revolução socialista pode impedir a terceira guerra mundial”.
No site desse grupo, dessa aliança, o texto é claro: "Tudo começou com o colonialismo, o imperialismo e o extrativismo."
E eles também pedem um corte no financiamento militar a Israel e o inicio de um processo de desmilitarização global.
Um dos braços dessa aliança, chamado de The Military Rise, luta pelo fim da polícia, das forças armadas e das prisões.
COP30 em Belém
Além do R$1 bilhão que o governo Lula reservou para a COP 30, ainda tem mais de R$260 milhões gastos com navios de luxo para resolver a falta de hospedagem.
O governo também gastou mais de R$500 milhões para um acordo com a Organização dos Estados Ibero-americanos para a organização do evento.
O governo Lula gastou tanto na COP porque quer vender a imagem de que ele está do lado do meio ambiente.
Ele destacou que esse mesmo governo que organiza a COP da Amazônia foi o que prejudicou o marco do saneamento básico.
O marco poderia resolver um grave problema ambiental do Brasil, os rios cheios de esgoto a céu aberto, principalmente nas grandes cidades da Amazônia.
Com os decretos de 2023, Lula abriu brechas para que as velhas estatais de saneamento voltassem a atuar sem licitação, enfraquecendo a iniciativa privada.
O governo também aumentou imposto sobre importação de carros elétricos e híbridos, dificultando a transição para tecnologias menos poluentes, dificultou.
Para receber a COP 30 em Belém, o governo ainda derrubou mata nativa para abrir estradas.
Foram mais de 100 hectares de mata nativa destruídos para a construção da chamada Avenida Liberdade.
Um desmatamento que chegou a ser criticado por Trump como um grande escândalo:
“Eles destruíram completamente a Floresta Amazônica brasileira para construir uma rodovia de quatro pistas para os ambientalistas viajarem. Isso se tornou um grande escândalo!”
Além disso, milhões de reais foram gastos nas obras de saneamento em Belém, mas mesmo assim a coleta de esgoto vai atender apenas 3% da cidade.
Além disso, Novais afirma que o governo deverá tomar metas de redução de carbono mais ambiciosas:
“O que o governo pretende apresentar na COP? aumentar suas metas de redução de gás de efeito estufa para o ano de 2035 para uma banda entre 59% e 67% de redução das emissões de 2005.”
Ele destacou que o governo pretende tomar medidas que atingem o agronegócio para alcançar essa finalidade:
“Como meio de implementação, o governo pretende implementar medidas que atinjam esses resultados. Uma delas é a redução da emissão de gases de efeito estufa da agropecuária em 50%, enquanto que os outros setores terão autorização para continuar aumentando suas emissões.”
A Brasil Paralelo investigou a questão ambiental a fundo com o documentário Cortina de Fumaça. Assista completo abaixo: