No começo da década de 2010, as redes sociais mostraram seu poder de derrubar governos e reformular a política mundial.
Protestos articulados online foram capazes de reformular a política no Oriente Médio em um movimento que ficou conhecido como Primavera Árabe.
O Departamento de Estado norte-americano e agências afins passaram a ver as redes como instrumento de política externa.
A estratégia era treinar dissidentes, financiá-los e equipá-los tecnicamente em parcerias com grandes empresas de tecnologia. Essa ação institucionalizou o uso de redes para mudança política, transformando campanhas civis em operações coordenadas.
O ex-funcionário do Departamento de Estado dos EUA, Mike Benz, afirma que essas operações foram feitas através do órgão de ajuda humanitária internacional USAID:
“A Primavera Árabe foi fruto de um conceito do Departamento de Estado dos EUA chamado diplomacia digital, às vezes chamado de Statecraft 2.0, e essa foi uma ideia que nasceu da Equipe de Planejamento de Políticas do Departamento de Estado.”
No entanto, o governo americano passaria a usar as redes sociais como ferramenta para censurar seus cidadãos e controlar a liberdade de expressão no país.
Esse processo aconteceu depois das eleições de 2016. A mídia tradicional já havia declarado a vitória da candidata democrata Hillary Clinton, ex-secretária de Estado e esposa do ex-presidente Bill Clinton.
No entanto, ela não contava com a força do apoio de Trump nas redes sociais e a capacidade delas de mudarem a política americana.
O mundo se chocou na madrugada do dia 9 de novembro, quando o Colégio Eleitoral confirmou a vitória do candidato republicano.
Mike Benz explica que a forma como o Estado agia sobre as redes sociais passou a mudar logo após as eleições:
“E foi exatamente aí que ocorreu a transição, durante o período da eleição de 2016 até os dias atuais, quando essas mesmas agências dos EUA passaram de uma diplomacia em favor da liberdade de expressão, pressionando governos estrangeiros e a rede de parceiros dos EUA com quem trabalhavam para promover a liberdade de expressão, para a promoção da censura.”
Os grandes veículos de imprensa e instituições do governo americano procuraram entender o motivo para a derrota.
Um relatório elaborado pelo operador político David Brock afirma que os republicanos venceram por conta dos meios digitais, com trechos como:
“Os democratas foram esmagados no espaço digital… Os programas digitais falharam em ouvir ativamente e engajar o universo de bases online.”
Órgãos governamentais passaram a enxergar Trump como uma ameaça por questionar abertamente algumas questões defendidas pelos dois partidos, segundo o ativista Tom Fitton:
“Eu acho que o trumpismo foi visto como uma ameaça, e ele pessoalmente foi visto como uma ameaça... Sabe, a sua disposição de ser cético em relação à sabedoria convencional de ambos os partidos foi algo que foi visto como uma ameaça.”
Por conta disso, as agências de inteligência dos EUA passaram a buscar uma forma de operar dentro do país para enfraquecer o governo e seus apoiadores.
No entanto, as leis americanas defendem que esses órgãos não têm autoridade para agir dentro do país contra cidadãos americanos.
Para isso, foi necessário estabelecer uma narrativa que ligasse apoiadores de Trump a inimigos externos dos EUA.
Em meio à tensão política após a eleição de 2016, foi fabricada a suspeita de que o governo russo teria agido para interferir nas eleições de 2016.
O jornalista John Solomon contou que chegou a conversar com agentes do FBI que o comentaram sobre o caso. Segundo eles, tratava-se apenas de uma fraude:
“Quando a história da colisão com a Rússia estourou no outono de 2016, meus contatos no FBI me disseram: não há nada ali. É apenas um arranhão. Isso vai desaparecer depois da eleição. Não é verdade. Estamos bastante confiantes de que não é verdade.”
Na doutrina do Estado americano, problemas de segurança nacional permitem usos legais e institucionais que seriam difíceis de ativar em outras condições.
Após o 11 de setembro, o governo aprovou o Patriotic Act e outras leis criadas para facilitar o combate ao terrorismo internacional.
Essas medidas aumentam o poder de vigilância e ação para alvos que representam uma ameaça direta à segurança dos EUA.
A narrativa sobre interferência direta da Rússia na política americana vinculava os apoiadores de Trump a inimigos estrangeiros, o que autorizava medidas drásticas.
O enquadramento como ameaça externa permitiu justificar captações, pedidos de dados e operações com base em procedimentos de inteligência.
A partir disso, essas organizações passaram a estruturar um sistema para controlar o debate no meio digital.
O complexo de segurança nacional passou a atuar conjuntamente com grandes plataformas como Facebook, Twitter e Google para estabelecer mecanismos sistemáticos de controle do discurso público.
Essa operação inclui agências governamentais, como:
A parceria era tal que, em muitos casos, os próprios funcionários do governo estavam integrados às equipes de moderação das plataformas.
Os Twitter Files, revelados após a aquisição da rede social por Elon Musk, mostraram comunicações diretas e frequentes entre agências de segurança e executivos da empresa.
Agentes do governo davam ordens explícitas para que determinados conteúdos fossem removidos, sobretudo durante o período eleitoral de 2020.
Mark Zuckerberg confirmou que o mesmo aconteceu com as redes sociais da Meta, empresa responsável pelo Whatsapp, Instagram e Facebook.
Durante uma entrevista no podcast The Joe Rogan Experience, Zuckerberg contou como a pressão acontecia:
“Basicamente, essas pessoas da administração Biden ligavam para a nossa equipe e, tipo, gritavam com eles e os xingavam… Chegou a um ponto em que a gente falou: ‘Não, não vamos, não vamos remover coisas que são verdadeiras. Isso é ridículo.’”
O empresário já havia denunciado esse tipo de ação em uma carta oficial para o então presidente do Congresso Americano, Jim Jordan.
O documento afirma que altos funcionários ligados à Casa Branca, teriam pressionado a empresa a censurar conteúdos ligados à Covid-19, inclusive postagens de humor e sátiras.
O mecanismo central desse regime de censura foi o uso de uma rede de ONGs, universidades e think tanks que passaram a desempenhar o papel de “intermediários de confiança”.
Instituições como a Stanford Internet Observatory, o Election Integrity Partnership (EIP), a Alliance for Securing Democracy e o Atlantic Council foram financiadas por verbas federais de agências como USAID o National Endowment for Democracy (NED).
Essas organizações operavam sistemas de vigilância digital que rastreavam conteúdos considerados “problemáticos”.
Agentes dessas ONGs atuaram em cooperação com funcionários públicos para monitorar postagens e enviar relatórios diretamente às plataformas digitais com pedidos remoção ou de supressão de alcance (shadow banning).
O ativista Matt Kibbe explica como essa articulação funcionava e destaca que muitas dessas ONGs recebiam grandes quantias de dinheiro público:
“Agências governamentais, burocratas do governo examinando os tweets do Tio Bob de maneira extremamente detalhada [...] muitas ONGs financiadas pelo governo, o que é uma contradição em termos.”
O consultor político Peter Schweizer afirma que os vínculos entre o governo americano vão além de parcerias e financiamento:
“Muitas dessas ONGs são compostas por ex-funcionários do governo, pessoas que trabalham em uma ONG vão trabalhar no Departamento de Segurança Interna. Chega uma nova administração, elas saem do Departamento de Segurança Interna e voltam para uma ONG.”
Mike Benz afirma que um alto funcionário da inteligência americana chamado Jared Cohen trabalhou nos escritórios da Google.
Seu trabalho se baseava em pensar maneiras criativas de usar os dados da Google de acordo com os interesses políticos dos EUA.
Assim, ele ajudou a criar um sistema de Inteligência Artificial que recebeu o nome de Google Ideas, transformado posteriormente em Google Jigsaw.
A ferramenta foi treinada com informações sobre a eleição de Trump e outros eventos históricos como a votação do Brexit para caçar informações consideradas falsas.
“Em 2016, zero por cento do discurso político era moderado por IA. Em 2019, mais de 98% do discurso político já era moderado por IA… Eu disse a todos da minha lista de contatos: se essa tecnologia de censura por IA for implementada, será o fim do conceito ocidental de liberdade de expressão.”
Mike Benz também contou que sete ex-diretores da CIA fazem parte do conselho de uma organização chamada Atlantic Council.
Trata-se de um think tank americano criado para pensar sobre questões internacionais. O grupo recebe financiamento de 11 agências governamentais.
O laboratório de Pesquisa Forense Digital (DFR Lab) do Atlantic Council se tornou destaque entre as equipes de checagem de fatos nas principais empresas de mídia social.
O Facebook anunciou um conglomerado responsável por redes de remoção de conteúdo, e o Atlantic Council foi o primeiro da lista, o mesmo aconteceu com o Twitter e o YouTube.
Segundo Benz, a organização chegou a enviar agentes para treinarem membros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para as eleições de 2022.
“O DFR Lab do Atlantic Council estava no conselho fundador de consultores externos do TSE brasileiro, que é uma subseção do STF. Eles estavam treinando juízes... Acredito que foram Graham Brookie e Emerson Brookings foram ao Brasil treinar o STF sobre como o estruturar sua censura da eleição de 2022 no Brasil da mesma forma que censuraram com sucesso a eleição de 2020 para impedir Trump.”
Ele também afirmou que “nove grupos formais de checagem de fatos que existiam no Brasil na época da eleição de 2022 eram financiados pelo governo dos EUA”. O mesmo processo também teria acontecido em outras partes do mundo.
Após a vitória nas eleições americanas do ano passado, Trump assinou uma ordem com o título “Restoring Freedom of Speech and Ending Federal Censorship”.
Com isso, ele formalmente proibiu agências de governo de participarem em ações de censura.
A censura nos EUA é o tema do mais novo documentário da Brasil Paralelo, God Complex. Todas essas informações e entrevistas estão no filme God Complex, da Brasil Paralelo.
Essa é a primeira produção voltada para o público americano e estuda como o governo do país estabeleceu uma máquina de censura.
Assista ao filme completo abaixo:
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