O termo “democracia” surgiu na Grécia e com o tempo foi ganhando diferentes formas. Mesmo sendo o modelo político mais comum, ela nem sempre foi bem vista.
Na modernidade, o sistema político conhecido como democracia ganhou alta popularidade social e adesão. O acadêmico Norberto Bobbio defende que a democracia é “o único caminho possível para um sistema político que vise o bem da população”.
Entenda como surgiu a democracia, suas características e entenda o porquê dessa adesão popular tão ampla, mesmo diante de governos democráticos em crise como o brasileiro.
Como surgiu a forma de governo conhecida como Democracia?
Para compreender o que é democracia é importante entender as principais formas de governo da antiguidade. Essas formas são categorias usadas pelos estudiosos da ciência política e do direito constitucional.
São diversos conceitos, como monarquia, tirania, aristocracia, oligarquia, democracia, demagogia e república.
Esses conceitos podem apresentar diferentes significados a depender do autor. Por exemplo, Sócrates considerava democracia uma boa forma de governo, enquanto Platão achava que era ruim.
O conceito de democracia como se tem hoje não é o mesmo que os filósofos estudavam. A ideia de democracia foi ganhando novos contornos com o tempo.
Esta compreensão auxilia a entender por que existem tantas crises em regimes contemporâneos que se consideram democráticos.
Este artigo é baseado no curso As Formas de Governo na História, do Professor Rafael Nogueira.
A origem da democracia na Antiguidade
As três principais formas de governo que foram implementadas em regimes da antiguidade são: monarquia, oligarquia e democracia. Na Grécia antiga é possível associar a uma pólis cada um desses modelos.
Em Esparta há uma oligarquia onde poucos guerreiros dominam a criação das leis e comandam o governo: as decisões diplomáticas, o início da guerra.
Em Atenas houve uma tentativa de implementar a democracia, um governo onde muitos governam mediante um sorteio entre aqueles que podem ser eleitos.
Cidades como Mégara e Corinto tiveram experiências monárquicas, onde apenas uma pessoa governava, este era chamado Basileu.
Explicar um pouco sobre cada modelo ajuda a entender os principais pontos que conceituam a democracia na antiguidade:
Democracia: o governo de muitos;
Oligarquia: o governo de um grupo escolhido, ou seleto;
Monarquia: o governo de apenas uma pessoa.
A democracia para Heródoto
Heródoto é conhecido como o pai da História. Grego de Halicarnasso, foi o primeiro a registrar por escrito fatos históricos que presenciou. Além de narrar a invasão da Pérsia, o historiador escreveu um diálogo entre três personagens persas que discutiam a melhor forma de governo.
Cada personagem defende uma das três formas principais de governo, enquanto tentam convencer os outros de que a sua ideia é a melhor.
Para o personagem que defende a democracia, esta forma de governo é mais que um grupo de várias pessoas deter o poder por um período definido e governar de acordo com regras. A democracia é um governo onde o grupo governa pensando em todos.
“Democracia” não era exatamente o termo usado por Heródoto, mas a ideia é a mesma do conceito apresentado. O termo surge em Atenas.
A democracia ateniense
Em muitos lugares é possível encontrar a explicação de que o termo “democracia” surge em Atenas justamente por conjugar duas palavras: “demos”, que significaria povo, e “kratia”, que é a palavra grega para poder. Portanto, democracia seria poder do povo.
No entanto, “Demos” era um distrito em Atenas onde havia eleições e sorteios para cargos públicos. Logo “demokratos” ou “demokratia” é uma espécie de governo distrital.
Quando seu modelo foi replicado para toda a cidade, surge o termo democracia para essa forma de governo.
No distrito ateniense havia eleições e sorteios para o que hoje é conhecido como Poder Judiciário; os magistrados eram eleitos.
Sócrates foi condenado por juízes que foram eleitos pelo povo ateniense. Na obra de Platão, a democracia toma um novo sentido.
A democracia em A República, de Platão
Em seu livro, o filósofo apresenta as três formas de governo de uma maneira diferente da que fez Heródoto. Embora vivesse em Atenas, Platão considerava a democracia uma forma de governo ruim.
Muitas vezes o filósofo em seus escritos tentou mostrar como a democracia era um governo que levava à desordem. O termo “bagunça” era muito usado por Platão.
Um exemplo que Platão sempre usava: quem quer comprar um cavalo chama todo mundo que conhece e faz uma votação para saber qual cavalo deve-se comprar ou consulta-se um especialista em cavalo?
O filósofo continua: se a pessoa deseja resolver um problema de saúde consultará um médico ou fará uma votação de qual é o tratamento?
Para Platão, em ambos os casos a pessoa busca o especialista, portanto por que nas coisas públicas as decisões têm de ser por sorteio ou eleição?
É importante pontuar que muitas das críticas de Platão tem relação com o contexto ateniense que ele viveu. Foi a democracia que matou Sócrates e ela estava em decadência no século V a.C.
Para Platão, os principais problemas da democracia são:
lentidão no processo político;
confusão dos cargos e processos;
a possibilidade de pessoas incompetentes assumirem cargos.
Aristóteles apresenta um novo panorama para o debate das formas de governo.
A democracia em Aristóteles
Há um erro comum ao se analisar a obra de Aristóteles. Muitos colocam que ele designa como bons governos a monarquia, a aristocracia e a democracia. Mas o termo usado por Aristóteles é “politeia”.
É um erro que costuma aparecer em algumas traduções de sua obra. Para Aristóteles, a democracia é uma forma de governo ruim. Para ele, além de ser o governo de muitos, é o governo dos pobres.
Apesar dessa visão, Aristóteles entende que as formas de governo não são absolutamente boas ou más em todos os casos.
Essa mudança será importante no desenvolvimento do conceito moderno de democracia.
O Iluminismo e a consolidação do conceito de democracia
Pintura representando os filósofos das luzes.
Antes de apresentar os autores que consolidaram a ideia moderna de democracia, é importante entender um conceito que apareceu no final do período medieval. Não era um debate comum do medievo, mas existiam autores escrevendo teses acerca de “direitos dos indivíduos”.
Esses direitos individuais serão a base para o conceito de direitos naturais ou de jusnaturalismo proposta pelos iluministas.
O Barão de Montesquieu consagrou em sua obra O espírito das leis conceitos fundamentais do Direito e da Ciência Política moderna.
Para o autor, existem três formas de governo: a república, a monarquia e o despotismo. A república é o modelo preferível porque é o governo de todos e é democrático.
Nas teses de Montesquieu aparece um ponto importante para compreender o que é democracia na contemporaneidade: a ideia de representatividade.
A democracia é o governo de todos apenas em teoria, na prática as pessoas apenas escolhem os seus representantes na assembleia mediante o voto. O povo não participa diretamente das escolhas do governo, mas delega essa função a pessoas que teoricamente defendem suas ideias.
Para o autor, uma república só é funcional quando há virtude, que seria uma espécie de responsabilidade cívica e amor à pátria.
Montesquieu defende com vigor que na república democrática haja a separação entre os poderes. Cada um dos três tem a sua função:
Poder Legislativo: elabora as leis;
Poder Judiciário: julga o cumprimento das leis;
Poder executivo: executa os projetos de governo.
O que garante a harmonia e o bom funcionamento entre os poderes é a teoria dos freios e contrapesos: cada Poder exerce seu papel ao mesmo tempo que observa o que o outro está fazendo.
Mas o que acontece quando um Poder interfere na decisão do outro? É possível eles entrarem em desarmonia? Clique no link para compreender melhor esse problema.
Outro conceito fundamental para compreender o que é a democracia moderna é o de soberania. O poder acima do qual não há outro maior é o soberano.
Pensadores iluministas como Hobbes e Rousseau defendem a ideia de que o povo é soberano. No livro Do contrato social de Jean-Jacques Rousseau ele propõe que o Estado deve ser a própria representação da vontade geral.
Essa ideia foi levada ao extremo durante o período do Terror jacobino. Robespierre considerava a si mesmo e os representantes do Estado a encarnação da vontade geral.
O resultado foi a perseguição de opositores, a implementação de um programa partidário ideológico e o distanciamento do povo.
Em contrapartida, a Independência dos Estados Unidos estabeleceu um governo republicano e federalista que segue a linha das principais democracias modernas.
Após esses eventos, o pensamento democrático se expandirá por todo o ocidente.