“Diante da excepcional urgência, decorrente da minha aposentadoria”. Com essas palavras o ministro Luís Roberto Barroso solicitou uma sessão extraordinária de julgamento para tratar de um tema que pode marcar sua despedida da Corte: a descriminalização do aborto até a 12ª semana.
O pedido foi formalizado nesta quinta-feira (17), em um despacho que cita “excepcional urgência” diante de sua aposentadoria iminente, com efeitos a partir de 18 de outubro de 2025.
“Solicito à Presidência desta Corte, com base no Regimento Interno, a convocação de sessão virtual extraordinária para continuidade do julgamento”, escreveu Barroso.
Se o pedido for aceito, o ministro pode encerrar sua trajetória no Supremo com um voto favorável à ADPF 442, ação que pede a descriminização do aborto até a 12ª semana de gestação.
A ação questiona os artigos 124 e 126 do Código Penal, que tipificam o aborto como crime.
A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442 é um processo levado ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).
Nessa ação, o partido pede que o STF reconheça que os artigos do Código Penal (124 e 126) são inconstitucionais. Ambos punem o aborto feito até a 12ª semana de gravidez, vão contra a Constituição Federal.
A Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442 foi apresentada pelo PSOL em 2017 e questiona os artigos 124 e 126 do Código Penal, que tipificam o aborto como crime.
O partido argumenta que a punição viola direitos fundamentais da mulher, como autonomia, dignidade e igualdade.
Em 2023, a então ministra Rosa Weber, prestes a se aposentar, votou pela descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação.
Ela alegou que impor a continuidade da gravidez seria uma forma de “violência institucional contra a integridade física e psíquica da mulher”.
No entanto, o julgamento foi interrompido justamente por um pedido do ministro Barroso, que solicitou que o tema saísse do plenário virtual e fosse discutido presencialmente.
Com o novo despacho, a história pode se repetir. Barroso pode seguir o exemplo de Rosa Weber e deixar um voto registrado antes de se aposentar, o que manteria o processo em andamento.
O movimento ocorre em meio à pressão de 61 entidades e mais de 200 pessoas que enviaram uma carta ao gabinete do ministro pedindo que ele vote não apenas na ADPF 442, mas também em outras duas ações sobre aborto:
Barroso já atuou no tema antes de integrar o STF: em 2012, como advogado, defendeu no tribunal a liberação do aborto em casos de fetos anencéfalos, decisão aprovada por maioria à época.
De acordo com Andrea Hoffmann, presidente do Instituto Isabel, a expectativa é de que o ministro Edson Fachin acolha a solicitação e que Barroso registre seu voto.
“Já conhecemos sua posição favorável ao aborto e, provavelmente, outro ministro fará um novo pedido de destaque. Vamos ver o que acontece”.
Zezé Luz, presidente da Rede Colaborativa Brasil, criticou a decisão de Barroso de priorizar a ação sobre o aborto às vésperas da aposentadoria.
“Por que apenas este processo seria urgente? Ele vai se aposentar, por livre escolha, e os processos em seu gabinete serão analisados e julgados pelo novo ministro que assumir, o fato dele pinçar um único processo e sobre este exclusivamente requerer uma urgência fictícia, fica evidente que não houve imparcialidade no julgamento e nem o curso natural do processo”.
Nos últimos anos, Barroso se manifestou diversas vezes a favor da descriminalização.
Em eventos públicos, afirmou que a criminalização do aborto “viola a autonomia e a igualdade da mulher” e que, se os homens engravidassem, “o tema já teria sido resolvido há muito tempo”.
Em 2022, porém, reconheceu que “o Brasil não está preparado” para o debate e que uma eventual decisão seria “apertada”.
Mesmo assim, seu histórico de declarações e votos deixa clara sua posição: o ministro entende o aborto como uma questão de política pública, não de direito penal.
A retomada do julgamento divide o Supremo e a sociedade. No Supremo, os ministros Kássio Nunes Marques e André Mendonça já declararam oposição à ampliação do aborto.
Ambos defendem que o tema deve ser tratado pelo Congresso Nacional, não pelo Judiciário.
Fora do STF, o debate é ainda mais intenso. Uma Pesquisa Ipsos-Ipec de julho de 2025 mostra que 75% dos brasileiros são contrários à descriminalização do aborto, enquanto 16% apoiam.
“Qual é a prioridade de legalizar o aborto na pauta nacional hoje? Isso é desejo da população brasileira? É óbvio que não”, afirmou o senador Eduardo Girão (Novo-CE), quando o tema voltou à pauta em 2023.
Para Zezé o percentual poderia ser maior se houvesse mais investimentos em cultura e educação.
“Fico muito feliz e satisfeita que a esmagadora maioria da população brasileira defenda a vida de bebês inocentes e indefesos. Ou seja, que possuem verdadeira consciência desse valor único e inviolável. O percentual poderia ser ainda maior, se os investimentos fossem feitos através da cultura e educação para à vida”.
Entidades religiosas e jurídicas, como a CNBB, a Anajure e o Instituto de Defesa da Vida e da Família mantêm posição firme contra o avanço das ações.
Para o bispo auxiliar de Brasília e secretário-geral da CNBB, dom Ricardo Hoepers, defender a vida desde o ventre é um princípio inegociável.
“Se não defendemos esse tema, nenhum outro tem sentido para nós.”
Em resposta, a União Brasileira de Juristas Católicos (UBRAJU) enviou uma carta ao ministro Edson Fachin pedindo calma, respeito à Constituição e responsabilidade no julgamento.
“A União Brasileira de Juristas Católicos envia carta ao Ministro Edson Fachin para pedir serenidade e respeito às regras constitucionais, bem como moralidade pública no julgamento de uma questão que causa tanto alvoroço e divisão no povo brasileiro”.
Barroso antecipou sua aposentadoria em oito anos. Segundo o ministro, é pessoal: quer se afastar da vida pública e dedicar-se à literatura e à espiritualidade.
No entanto, antes de sair, o ministro deixa três ações sobre aborto sob sua relatoria, todas sensíveis e de grande repercussão.
A forma como decidir se despedir, com ou sem voto na ADPF 442, deve influenciar diretamente a postura da futura composição do Supremo.
A escolha do sucessor cabe ao presidente Lula, que anunciou o nome do advogado-geral da União, Jorge Messias.
Para os defensores da descriminalização, a medida representaria um avanço civilizatório e um passo em direção à igualdade de gênero. Para os opositores, seria a ruptura de um princípio constitucional: o direito à vida desde a concepção.
O desfecho do voto de Barroso pode influenciar o tom do debate jurídico e moral no Brasil nos próximos anos
Sua aposentadoria marca o fim de um período de forte atuação do Supremo em temas sensíveis e abre espaço para novas discussões sobre o papel da Corte e do Congresso em questões morais.
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