Muitos se lembrarão do presidente Mujica como um líder carismático e "pobre". Um homem vivia em sua chácara, dirigia um fusca azul de 1987 e doava cerca de 90% de seu salário, mesmo enquanto governava o país.
O ex-presidente do Uruguai, José Alberto "Pepe" Mujica Cordano, morreu nesta terça-feira (13), em Montevidéu, sete dias antes de completar 90.
A causa foi um câncer no estômago complicado por uma doença imunológica, sua condição foi divulgado ao publico em abril de 2024.
No entanto, para além da imagem pública de um senhor pacato, existe um lado pouco conhecido de Pepe Mujica.
Na década de 1960, José Mujica trocou a rotina pacata de agricultor e vendedor de flores pela militância armada.
Ele se uniu ao Movimento de Libertação Nacional - Tupamaros (MLN-T), um grupo guerrilheiro de inspiração marxista que ganhou notoriedade no Uruguai por ações como assaltos a bancos, sequestros e atentados contra instituições do Estado.
Mujica participou ativamente dessas operações. Era um tempo em que se acreditava que a transformação social passava pela luta armada.
Décadas depois, já como ex-presidente do Uruguai, ele relembrou esse período turbulento em entrevistas concedidas ao cineasta Emir Kusturica, no documentário El Pepe, uma vida suprema
"Há poucos crimes piores do que fundar um banco, ganhar dinheiro com o dinheiro dos outros é como um destilado, a quintessência do capitalismo… é a coisa mais linda entrar em um banco com uma .45 na mão: todos te respeitam"
Um dos ataques mais famosos do qual ele participou foi a tomada da cidade de Pando, em 1969.
O pequeno município na zona metropolitana de Montevidéu foi invadido pelos tupamaros, que atacaram a delegacia, o quartel dos bombeiros, a central telefônica e vários bancos.
Mujica foi preso diversas vezes por participar da luta armada. Em uma de suas passagens pela prisão, em 1971, ele fugiu junto com 105 tupamaros e alguns presos comuns após escavarem as paredes da cela com arames das camas.
Foi recapturado no ano seguinte, após ser baleado seis vezes durante um confronto com a polícia.
O futuro presidente passou os 13 anos seguintes preso, deixando a cadeia após a anistia geral, que marcou o fim do regime militar uruguaio em 1985.
Com a redemocratização, Mujica e outros ex-tupamaros ingressaram na política institucional.
Ele foi um dos fundadores do Movimento de Participação Popular (MPP), que se tornou uma força importante dentro da coalizão de esquerda conhecida como Frente Ampla.
Sua ascensão política foi gradual: elegeu-se deputado em 1994, senador em 1999, e em 2005 assumiu o Ministério da Pecuária, Agricultura e Pesca no primeiro governo de Tabaré Vázquez.
A trajetória culminou com sua eleição para a presidência em 2009, ganhando de Luis Alberto Lacalle com cerca de 52,6%.
Durante seu mandato, o Uruguai implementou uma série de políticas consideradas progressistas, como:
A gestão também aumentou consideravelmente os gastos públicos com programas sociais.
A gestão de Pepe Mujica também foi marcada por escândalos e investigações por corrupção e má administração.
Um dos casos mais emblemáticos envolveu a estatal petrolífera ANCAP, que durante seu governo acumulou déficits. Apenas em 2014, a empresa perdeu R$807.
O caso foi à Justiça em 2018, depois que o parlamento aprovou uma capitalização de aproximadamente R$2 bilhões, o equivalente a 2% do PIB uruguaio, para evitar a falência da companhia.
Um dos principais afetados pelo caso foi o então presidente da Ancap, Raúl Fernando Sendic, filho do líder tupamaro Raúl Sendic.
Em 2016, a câmara dos deputados do Uruguai aprovou a abertura de uma CPI sobre um suposto caso de corrupção que envolveu a empreiteira OAS.
O caso envolveu uma planta de extração de gás operada pela empresa de energia GNLS.
O projeto, que não foi concluído, causou um prejuízo de mais de R$162 milhões aos cofres públicos.
O deputado que apresentou a denúncia, Pablo Abdala (Partido Nacional), alegou que documentos brasileiros indicavam o envolvimento de Fernando Pimentel (PT).
O então ministro do Desenvolvimento, teria se reunido com um alto funcionário do governo uruguaio para obter o contrato para a OAS.
As investigações não tiveram conclusões sobre o caso e nem chegaram aos tribunais do Uruguai.
Mesmo após deixar a política de seu país por questões de saúde em 2020, Mujica não se afastou da vida pública.
O ex-presidente continuou a opinar sobre debates regionais e globais, dando apoio a figuras de esquerda na América Latina.
Mujica manteve uma relação próxima com Lula, a quem visitou na prisão em Curitiba em 2018 e apoiou durante a campanha eleitoral de 2022. O uruguaio chegou a participar de comícios em São Paulo.
Lula condecorou Mujica com a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, uma das maiores homenagens do Brasil a estrangeiros, em 2024.
Em uma de suas últimas declarações finais, Mujica fez críticas ao presidente argentino Javier Milei, classificando-o como um "contrapeso negativo":
"É um contrapeso muito negativo. É como se fosse um governante, mais ou menos, dos EUA, não da América Latina", afirmou, em entrevista à rádio Sarandí.
Ele também disse que acredita na capacidade do Brasil se tornar uma grande potência:
"Será uma grande potência, inequivocamente. Pela forma de crescer, pelos recursos, pelas dimensões que tem e por alguns outros fatores".
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