Ofensas a símbolos cristãos poderão virar caso de punição em Salvador. A Câmara Municipal aprovou o primeiro projeto de lei do país voltado ao combate à cristofobia.
A proposta foi apresentada em fevereiro, após uma polêmica envolvendo a cantora Claudia Leitte. O autor do projeto é o vereador Cezar Leite (PL-BA),
A aprovação ocorreu em 24 de setembro, com 35 votos favoráveis e 4 contrários, de parlamentares do PSOL, PCdoB e PT. O projeto agora segue para sanção do prefeito Bruno Reis (União Brasil).
O projeto cria um programa municipal permanente de combate à cristofobia, que combina medidas educativas, preventivas e punitivas.
O texto proíbe ataques diretos ou indiretos a símbolos cristãos, sejam eles verbais, escritos ou físicos.
Também impede o uso de imagens religiosas de forma considerada pejorativa, sensual ou desrespeitosa em festas populares como o Carnaval.
Empresas, blocos, camarotes e pessoas físicas identificadas que descumprirem a norma estarão sujeitas a multas de até três salários mínimos, com dobro do valor em caso de reincidência.
A contratação de artistas condenados por crimes de intolerância religiosa também ficará proibida com recursos públicos municipais.
Além das penalidades, a lei prevê a criação de canais de denúncia, campanhas educativas e parcerias com instituições religiosas e civis para promover o diálogo e a tolerância entre diferentes crenças.
O texto ainda determina formação continuada de servidores públicos nas áreas de saúde, educação, segurança e assistência social sobre respeito à diversidade religiosa.
Os valores arrecadados com as multas serão destinados a ações educativas e programas de conscientização.
A proposta ganhou força depois de uma polêmica que expôs o embate entre fé e liberdade artística.
O episódio envolvendo a cantora Claudia Leitte foi apontado pelo autor do projeto como um exemplo de intolerância contra cristãos e motivou a criação da lei agora aprovada.
A polêmica envolvendo Claudia Leitte começou no fim de 2024, quando a cantora foi acusada de racismo religioso e intolerância por alterar um trecho da música Caranguejo, um de seus maiores sucessos.
Durante um show em Salvador, ela trocou o nome de Iemanjá, orixá cultuado nas religiões afro-brasileiras, por Yeshua, termo hebraico usado para se referir a Jesus.
A mudança gerou repercussão após ser denunciada ao Ministério Público da Bahia (MP-BA).
A denúncia foi feita pela Iyalorixá (mãe de santo) Jaciara Ribeiro, líder religiosa e filha de Mãe Gilda de Ogum, e pelo Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (IDAFRO).
O MP-BA abriu um inquérito por meio da Promotoria de Justiça de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa para investigar se a substituição configuraria discriminação ou ofensa às religiões de matriz africana.
Em resposta à controvérsia, Claudia Leitte retirou Caranguejo de seu repertório durante o Festival Virada Salvador, evento de Réveillon na capital baiana, e se pronunciou pela primeira vez sobre o caso.
Ela afirmou que o racismo é “um assunto muito sério” e deve ser tratado “com respeito, solidariedade e integridade”, sem ser “julgado pelo tribunal da internet”.
A artista, que se declara evangélica, manteve a versão com a menção a Yeshua em apresentações fora da Bahia, como em Recife. Em Salvador, porém, decidiu não cantar a música, onde a polêmica havia ganhado maior repercussão.
O episódio também afetou a relação entre Claudia Leitte e Ivete Sangalo, as duas maiores representantes do axé music. Poucos dias após a polêmica, Claudia deixou de seguir Ivete nas redes sociais.
Embora tenha evitado comentar o motivo, Ivete reagiu em uma publicação do secretário de Cultura de Salvador, Pedro Tourinho. Na postagem, ele criticava a substituição do nome de orixás em músicas populares.
A cantora curtiu o post e respondeu com um “sim” nos comentários, gesto que foi interpretado por parte do público como um apoio indireto às críticas.
Em 16 de dezembro de 2024, Tourinho publicou uma nota em seu perfil no Instagram, sem citar Claudia nominalmente, na qual afirmou que “a retirada de nomes de orixás das músicas é um ato de racismo”.
“Quando um artista se diz parte do movimento do axé, saúda o povo negro e sua cultura, mas escolhe reescrever a história e retirar o nome dos orixás das músicas, o nome disso é racismo”.
O secretário também destacou o protagonismo de artistas brancos no gênero e a marginalização histórica de músicos negros, especialmente nas bandas e nos bastidores do axé.
A declaração repercutiu amplamente nas redes sociais, ampliando a controvérsia e levando o caso à esfera judicial.
Enquanto enfrentava críticas e denúncias, Claudia também recebeu apoio de fãs e de outros artistas. Entre os que se manifestaram a favor da cantora estão Paula Lima e Érika Januza, que defenderam seu direito à liberdade religiosa.
O músico Carlinhos Brown, fundador do Candyall Guetho Square, local onde Claudia se apresentou quando a polêmica ganhou força, também saiu em sua defesa.
Em entrevista, Brown declarou que o Guetho é “uma casa laica”, onde todos têm direito de expressar sua fé. Ele afirmou:
“Todas as pessoas têm direito a ter suas manifestações. A atitude de Claudia é algo que eu não queria comentar, porque é polêmica, mas posso garantir que Claudia Leitte não é uma pessoa racista.”
O episódio voltou a colocar em pauta o debate sobre liberdade de crença, expressão artística e respeito às religiões de matriz africana.
Ele também se tornou o ponto de partida para o projeto de lei contra a cristofobia, apresentado pelo vereador Cezar Leite (PL).
Durante a sessão, representantes cristãos relataram ter sido vaiados e impedidos de falar, o que, segundo o vereador Cezar Leite, demonstrou “cristofobia e silenciamento de vozes religiosas”.
O texto aprovado será analisado pelo prefeito Bruno Reis, que deve decidir até outubro se sanciona ou veta a proposta. Caso entre em vigor, Salvador será a primeira cidade do país a instituir uma lei específica contra a cristofobia.
Como um veículo independente, não aceitamos dinheiro público. O que financia nossa estrutura são as assinaturas de cada pessoa que acredita em nossa causa.
Quanto mais pessoas tivermos conosco nesta missão, mais longe iremos. Por isso, agradecemos o apoio de todos.
Seja também um membro da Brasil Paralelo e nos ajude a expandir nosso jornalismo.
Cupom aplicado 37% OFF
Cupom aplicado 62% OFF
MAIOR DESCONTO
Cupom aplicado 54% OFF
Assine e tenha 12 meses de acesso a todo o catálogo e aos próximos lançamentos da BP