O órgão convocou bolsas de mercadorias para atestar que os vencedores do leilão têm plena capacidade de cumprir os contratos com o governo. Segundo o site do Banco Central, uma bolsa de mercadorias é composta por associações privadas civis que têm como objetivo garantir a transparência dos contratos entre o governo e as empresas privadas.
A ata de leilão público divulgada pela entidade mostra as empresas vencedoras foram Zafira Trading Ltda, Asr Locação de Veículos e Máquinas Ltda, Icefruit Indústria e Comércio de Alimentos Ltda e Wisley A. de Souza Ltda.
De acordo com a Classificação Nacional das Atividades Econômicas (CNAE), apenas uma das empresas vencedoras têm o comércio exterior como seu ramo de atividade principal. Esse fato despertou a atenção de políticos da oposição e da imprensa, que questionaram a capacidade das outras três empresas, cujas atividades são diferentes, de cumprir adequadamente os contratos firmados.
Empresa de laticínios receberá maior valor
Um dos fatos que mais chamou a atenção foi o de que a maior cota do leilão foi arrematada por um empreendimento descrito como vendedor de leite e laticínios. Com sede no Amapá, a companhia é avaliada pelo site de vendas B2B econodata como contendo baixa assertividade em seus contratos.
Isso significa que a companhia frequentemente não cumpre prazos ou mesmo deixa de entregar o serviço contratado no prazo estabelecido pelo contrato.
A Queijo Minas, nome fantasia da Wisley A. de Souza Ltda, está ativa desde 2006 e é de propriedade de apenas uma pessoa. A empresa receberá R$736,3 milhões como pagamento pela importação e distribuição de 143,3 mil toneladas de arroz.
O segundo maior lote foi arrematado pela única empresa do grupo que está registrada como importadora. A Zafira Trading Ltda receberá R$368,9 milhões pela importação e distribuição do alimento. As demais empresas vencedoras, registradas como locadoras de veículos e indústria de alimentos, receberão R$112,5 milhões e R$98,7 milhões respectivamente.
Locadora de veículos que venceu o pregão já se envolveu em corrupção
A Asr Locação de Veículos e Máquinas Ltda, cuja principal atividade é o aluguel de equipamentos, chamou a atenção por possuir uma variedade de ramos de atuação sem correlação aparente entre si. De acordo com o Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), a empresa também atua nos setores de construção de edifícios e rodovias, obras, publicidade, desenvolvimento de programas de computador, serviços de escritório e de limpeza. Além disso, o empreendimento se apresenta como comerciante atacadista de diversas categorias, incluindo cereais.
Um grande veículo de imprensa procurou a empresa para entender melhor suas atividades. A assessoria de comunicação da ASR informou que a empresa já trabalha com licitações há mais de 10 anos, tendo vencido um leilão da CONAB no final do ano passado. Na ocasião, a empresa foi contratada para distribuir 2.011 mil sacas de milho na Bahia.
Crispiniano Espindola Wanderley, o único sócio da empresa, esteve envolvido em uma investigação de corrupção em 2007. Na época, Alberto Fraga, então secretário de Transportes do Distrito Federal, teria exigido de Wanderley o valor de R$350 mil para assinar um contrato de ônibus com a cooperativa presidida pelo empresário.
Fraga foi condenado, mas recorreu e acabou sendo inocentado. Wanderley, por sua vez, não foi investigado. Embora membros da cooperativa alegassem que o pagamento de propina foi o motivo da destituição de Wanderley da presidência da entidade, a Justiça entendeu que não havia provas suficientes para a abertura de um inquérito.
Conab reitera licitude do pregão
Em nota, o órgão afirmou que considera a transparência e a segurança jurídica como valores inegociáveis. A entidade reiterou que espera garantir a solidez da transação, considerada uma "grande operação".
A Conab foi criada em 1990, através da fusão entre a Companhia de Financiamento da Produção (CFP), a Companhia Brasileira de Alimentos (Cobal) e a Companhia Brasileira de Armazenamento (Cibrazem). Seu objetivo é fornecer ao governo federal informações técnicas para embasar a tomada de decisões na elaboração de políticas voltadas à agricultura.
A entidade recebeu do governo Lula a incumbência de intermediar a compra de arroz estrangeiro por parte do governo. A medida foi tomada para evitar uma possível escassez do grão, um dos principais itens do prato do brasileiro.
Cerca de 70% da produção de arroz no Brasil é feita no Rio Grande do Sul, estado que tem sido afetado por inundações desde o final de abril.
No dia 9 de maio de 2024, o governo publicou uma Medida Provisória que o autoriza a comprar até 1 milhão de toneladas do grão, com o objetivo de impedir a interrupção no fornecimento em todo o Brasil. A justificativa é o impacto da tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul na plantação, logística e distribuição de arroz. O estado é responsável por 70% do abastecimento nacional.
O alimento será vendido pelo valor tabelado de R$4,00 o quilo.
Na ocasião da assinatura da medida, produtores alegaram que o impacto não tinha sido tão consistente. O Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga) afirmou que 82,9% das lavouras haviam sido colhidas antes das enchentes, restando apenas cerca de 150 mil hectares.
O órgão alegou ainda que a região central do estado foi a que apresentou menor percentual de área colhida, com 62%.
O fato de as áreas mais impactadas pelas enchentes não influenciarem tanto na redução das produção de arroz foi uma das razões para o questionamento da necessidade de o governo importar os grãos, iniciativa popularmente conhecida como “Arroz Brás ".
Na época, foi questionado também o impacto da medida sobre produtores e distribuidores de arroz, sobretudo no momento em que a economia do estado precisará se reestruturar.