Tallis Gomes

Fundador, mentor e Presidente do G4 Educação. Fundador da Easy Taxi e Singu, sócio da CRM & Bônus e membro do conselho de administração do Grupo HOPE.

Líderes forjados em tempos de crises

O que distingue as grandes lideranças das medíocres vai além da capacidade de proteger o caixa diante das incertezas.

Tallis Gomes

Derivada do grego antigo krísis, a etimologia da palavra “crise” era frequentemente utilizada para descrever o momento de virada em uma doença, em que o resultado final poderia ser a recuperação ou morte

Assim, ao mesmo tempo em que representava uma ocasião de perigo extremo, a sua natureza dual também encerra em si uma possibilidade para mudança e melhoria. Cabe tão somente a cada indivíduo interpretar como ele enxerga aquilo que lhe acontece.  

De fato, essa dualidade pode ser observada no legado de muitos grandes líderes da antiguidade, que se destacaram justamente por sua capacidade de liderar em momentos de turbulência.

Júlio César, Sun Tzu, Hannibal Barca, Alexandre Magno… Todos enfrentaram períodos de instabilidade extrema, tanto militares quanto políticas, e precisaram descobrir como manobrar circunstâncias adversas para criar oportunidades contra um inimigo superior. 

Isso porque a história nos ensina uma lição clara: a maior força de um líder está na sua capacidade de suportar pressão. Se você está no Brasil, meu caro, a incerteza vai te acompanhar. Além do caminho não ser linear, ainda é esburacado, cheio de curvas e escuro. O nosso país vive hoje múltiplas crises

Além do vexame de termos passado a Argentina como o mais endividado da América Latina, atingindo a marca de 85% do Produto Interno Bruto (PIB) em dívida pública, vivemos um ambiente em que os direitos de quem trabalha duro são talhados diariamente, os três poderes se engalfinham, bandidos são absolvidos e na nossa mais Alta Corte temos militantes de toga

Para piorar, o Estado, que deveria ser o mediador para solucionar esses conflitos, é omisso com as questões nacionais e lava as mãos de forma covarde.

Fazer parte da Iniciativa Privada, então, sem apadrinhamento político, é um ato de rebeldia e resistência. Como diria uma frase muito comum no meio dos U.S. Navy Seals, aqui, para o empreendedor, “o último dia fácil foi ontem”.

Por isso, conseguir passar por essas tormentas sem desanimar, dando segurança à companhia para executar a estratégia até o último segundo, é o que separa os líderes adultos dos meninos.

A propósito, tenho um fascínio particular pelos Navy Seals - a força especial da marinha americana, uma organização de altíssima performance que enfrenta situações extremamente complexas e de alto risco.  

Como filho e neto de militares, sempre me foi exigido dar o extra mile para me tornar um homem íntegro, que não coloca preço nos seus princípios e que sabe operar em qualquer terreno. 

Por esse motivo, algumas das técnicas mais importantes que estão no meu framework de liderança, incluem insights de condutas adotadas em operações especiais que podem ser replicadas em qualquer tipo de gestão para desenvolver guerreiros por excelência no campo de batalha:

#1 - Faça as pazes com o caos constante

Em missões de combate, comandantes e tropas são treinados para aceitar que a confusão, o perigo e a incerteza serão constantes. Eles não apenas esperam por isso, como se preparam mentalmente para lidar com o caos como algo inerente à função. 

Da mesma forma, líderes forjados em tempos de incerteza precisam compreender que a turbulência é inevitável e fazer as pazes com esse fato - você estará constantemente cercado por questões legais, de produtos, serviços, vendas, financiamento, recrutamento, viagens e muito mais. 

Pior, haverão sempre mil coisas para fazer e tempo para apenas cem, mas isso nunca vai mudar. Resistir ou ficar paralisado só compromete a sua capacidade de resposta. O caos é uma realidade permanente que você precisa abraçar.

Saiba onde estão as minas terrestres e escolha apagar um incêndio de cada vez, adotando um princípio inegociável utilizado pelos Navy Seals: “priorize e execute” - é esse mindset que permitirá executar bem as habilidades que um empreendedor de alta performance precisa ter, mesmo quando tudo estiver desmoronando.

#2 - Times de elite não se acham, se criam

Assim como ninguém nasce líder, é preciso se capacitar para se tornar um, as melhores equipes também não surgem naturalmente.

Na maioria das vezes, ninguém está pronto. Na primeira vez que assumi um cargo de CEO, eu nem sabia direito o que a sigla significava.

No G4 Educação, um pouco antes de aumentarmos o time e mudarmos de prédio, meu diretor comercial me disse que não se sentia preparado para o desafio. Hoje, o time está melhor e mais forte que nunca.

Pessoas são a sua maior vantagem competitiva. E, obviamente, elas são o resultado da sua cultura. Seja gestor, C-level ou diretoria, o exemplo de viver os valores, como trabalho duro, lealdade, transparência, precisam começar da liderança. Portanto, nunca ouse cobrar o que você não vive.

Seja o primeiro a chegar e o último a sair. Se for necessário vender, venda. Sente-se no meio do seu time, ouça os desafios, deixe claro o que falta, mostre a linha de chegada e os instigue a encontrar soluções que acelerem os resultados. 

Não seja soft e nem aceite crescer “na média”. As ideias mais criativas sempre surgem sob pressão. Por isso, todo o regime de treinamento mental, condicionamento e planejamento de contingência deve ser projetado para permitir ações rápidas e eficazes.

Mesas de sinuca, puffs coloridos, escorregadores… toda essa bullshitagem para tornar as empresas um “playground” não adianta de nada.

O que realmente atrai profissionais triple-A é estar no meio de pessoas fora da curva em  um ambiente que verdadeiramente premia os que se dedicam.

#3 - Deixe as emoções do lado de fora da sala

Aprendi com o mestre Fábio Gurgel que a coragem é treinável. Isso significa jamais deixar o medo tomar decisões por você. Ele nada mais é do que uma emoção que revela uma escolha: ir para cima ou se acovardar.

Diligência, precaução, inteligência e esforço… tudo isso é essencial, mas se você não for capaz de administrar os seus sentimentos, pode acabar deixando de fazer muitas coisas no seu business.

O que te manterá no jogo do longo prazo é, em primeiro lugar, quanta porrada você aguenta levar sem se abater e sem descontar as frustrações em quem quer que seja, especialmente seu time, seus sócios e sua família.

Seja para ter conversas difíceis com seus liderados, seja para realizar uma negociação intimidadora em um processo de M&A, deixar as emoções da porta para fora e levar apenas a coragem para a mesa é fundamental.

#4 - Desistir não é uma opção

Um ingrediente que separa aqueles que fazem a diferença no mundo daqueles que não fazem é a atitude.

Quando tudo dá errado, apenas uma minoria bem-sucedida está disposta a tentar de novo no outro dia, apesar do desconforto.

Um verdadeiro gestor é aquele que se recusa a oscilar entre vitória e derrota. Em vez disso, ele sabe que desistir simplesmente não é uma opção viável. Cada revés é uma oportunidade para reforçar suas estratégias, redirecionar esforços e emergir mais forte.

Olhe para os melhores líderes que você já conheceu. Todos estavam comprometidos com uma coisa: resultado. E continuaram avançando mesmo depois de serem fisicamente derrotados e contra probabilidades impossíveis.

Então, quando o mundo desaba, não entregue os pontos. Encontre forças nas suas convicções, nutra-se da determinação que te trouxe até aqui e lembre-se de que os maiores triunfos muitas vezes nascem das cinzas do fracasso aparente, já que são os cenários de crise os mais propícios para criação de ecossistemas inovadores.

#5 - Crie o seu próprio war room

Assim como as forças militares de elite dependem de sistemas robustos de inteligência e reconhecimento para operações bem-sucedidas, os líderes e founders também precisam construir seus próprios mecanismos de coleta e análise de informações críticas.

Em tempos de guerra, antecipação e resposta rápidas são fundamentais. Você precisa ter os dedos firmes no pulso de tudo o que está acontecendo - dentro e fora da organização. Precisões, ameaças, tendências emergentes, nada pode passar despercebido.

Criar o seu próprio war room é sentar-se na mesa dos adultos, tendo um ambiente projetado para permitir foco total, análise em tempo real e tomada de decisões ágeis.

Esse pode ser um escritório fechado ou uma sala de reuniões isolada, não importa. O importante é estabelecer um santuário particular onde você possa reunir suas melhores mentes, estudar os dados mais recentes, debater cenários e formular novas táticas.

Lá dentro, as regras são claras: nenhuma interrupção, nenhuma divagação, apenas análise cirúrgica dos fatos e brainstorming incansável de contramedidas. É uma zona exclusiva para pensamento estratégico de alto nível.

Seja nos momentos de preparação ou no olho do furacão, os melhores líderes compreendem o valor de ter esse tipo de espaço sagrado. 

Ainda que não seja “o que você conhece”, olhe para esse pipeline e busque aplicá-lo dentro da sua realidade para construir um negócio mais resiliente, ambidestro e antifrágil. 

No fim, em um país como o nosso, onde “dar um jeitinho” é a regra, você ainda verá que é possível escolher fazer o que é correto, acima do que é conveniente, mesmo diante de provações constantes.