Durante décadas, Israel adotou uma postura estratégica: nunca confirmou nem negou possuir armas nucleares.
Oficialmente, mantinha uma política de “ambiguidade intencional”, enquanto o mundo especulava. No entanto em 1986, esse segredo começou a ruir.
Foi quando um ex-técnico de usina nuclear, Mordechai Vanunu, rompeu o silêncio e entregou ao mundo as primeiras provas concretas do programa nuclear secreto de Israel.
O preço da revelação? Dezoito anos de prisão, sequestro internacional e décadas de restrições.
Desde sua fundação, Israel vê no poder nuclear uma forma de defesa contra inimigos vizinhos. No entanto, por motivos diplomáticos, optou por manter o tema fora do debate público.
O ex-presidente de Israel Shimon Peres e o diplomata israelense Aaron Sagui afirmaram em oportunidades distintas que : Israel não será o primeiro país a introduzir armas nucleares no Oriente Médio.
A ambiguidade era conveniente especialmente para evitar pressões internacionais e manter boas relações com aliados como os Estados Unidos.
Tanto que Israel nunca assinou o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), o principal acordo global contra a disseminação dessas armas.
Ainda assim, sinais da existência de um arsenal secreto sempre estiveram no ar.
Mordechai Vanunu trabalhou durante nove anos no reator nuclear de Dimona, no deserto de Negev, ao sul de Israel. No fim de 1985, decepcionado com as políticas israelenses e com o uso militar do programa, decidiu sair do país.
Antes de deixar o emprego, fotografou em segredo áreas estratégicas da usina. Nas fotos estavam laboratórios e equipamentos usados para extrair plutônio e montar dispositivos nucleares.
Já na Austrália, Vanunu se aproximou de grupos antinucleares e acabou convencido a divulgar as imagens. Foi então que procurou o jornalista Peter Hounam, do jornal britânico The Sunday Times.
Capa do jornal The Sunday Times. Imagem: Site Peter Hounam.
As informações passaram por semanas de verificação com especialistas. Em outubro de 1986, veio a bomba: a manchete “Revelados: os segredos do arsenal nuclear de Israel” estampava o jornal inglês.
A reportagem concluía que Israel já havia produzido cerca de 200 ogivas nucleares, tornando-se, silenciosamente, a sexta maior potência atômica do planeta.
A matéria foi publicada no domingo, 5 de outubro de 1986. De acordo com a BBC, no mesmo dia, Vanunu desapareceu.
Sem saber, ele havia sido alvo de uma operação do serviço secreto israelense, o Mossad.
Dias antes, em Londres, foi abordado por uma mulher Cheryl, supostamente uma turista americana. Na verdade, era uma agente que o convenceu a viajar com ela para Roma. Lá, ele foi sequestrado, dopado e levado clandestinamente de volta a Israel.
O governo só confirmou a prisão semanas depois. Vanunu foi condenado por traição e espionagem. Cumpriu 18 anos de prisão, sendo 11 deles em total isolamento.
Para o governo israelense, Vanunu cometeu um ato de traição. Para seus apoiadores, ele apenas revelou ao mundo um segredo que já não podia mais ser mantido e abriu um debate necessário sobre segurança, transparência e ética.
Em sua primeira entrevista após a prisão, disse:
“O que eu fiz foi informar o mundo sobre o que está acontecendo em segredo. Não disse que devemos destruir Israel. Disse: vejam o que vocês têm e julguem por si mesmos.”
Desde que foi libertado, em 2004, Vanunu vive em Israel sob severas restrições. Não pode sair do país nem dar entrevistas a estrangeiros. Ainda assim, tornou-se um símbolo da luta pela transparência e pelo desarmamento nuclear.
Durante anos, Israel sustentou que Dimona era apenas uma “fábrica têxtil”.
Inspeções dos EUA chegaram a visitar o local nos anos 1960. No entanto, relatos sugerem que não tiveram acesso aos andares subterrâneos escondidos por paredes de concreto e entradas falsas.
A Federação dos Cientistas Americanos (FAS) e o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (Sipri) estimam que Israel tenha cerca de 90 ogivas nucleares.
Apesar disso, o país segue fora do TNP e evita qualquer debate público sobre o tema.
Em tempos de tensão com o Irã, o programa nuclear de Israel volta ao centro das atenções, não oficialmente, mas nas entrelinhas de falas como a do primeiro-ministro Netanyahu:
“Desferimos um golpe no cerne do programa de armas do Irã.”
Embora não confirme nem negue possuir um programa nuclear, Israel adota uma postura vigilante diante de atividades atômicas no Oriente Médio. Essa estratégia já motivou ações militares contra instalações nucleares em dois países da região: Iraque e Irã.
Segundo o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu:
"Não teremos um segundo holocausto, um holocausto nuclear. Já tivemos um no século passado - o Estado judeu não vai permitir que o holocausto seja cometido contra o povo judeu. Isso não vai acontecer."
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