A BBC admitiu ter violado seus próprios padrões editoriais. O motivo foi a exibição de um documentário sobre a Faixa de Gaza sem revelar que o narrador era filho de um integrante do alto escalão do Hamas.
O caso gerou críticas de ex-funcionários da emissora e de membros do governo britânico.
O documentário em questão, intitulado Gaza: How to Survive a Warzone, foi produzido pela Hoyo Films e ficou disponível no serviço BBC iPlayer no início de 2024.
A produção é narrada por um menino de 13 anos, que se apresenta como um jovem morador de Gaza descrevendo a vida em meio ao conflito.
O problema: o garoto é filho do atual vice-ministro da Agricultura em Gaza. O governo local é liderado pelo Hamas, organização considerada terrorista por Reino Unido, Estados Unidos e União Europeia.
A BBC diz que só descobriu a ligação familiar após questionamentos da imprensa.
Diante da repercussão, a emissora retirou o documentário do ar e conduziu uma investigação interna.
Em comunicado oficial, o diretor-geral Tim Davie reconheceu que houve uma "falha significativa" nos processos de verificação editorial e pediu desculpas públicas.
A revisão apontou que não houve interferência direta da família do menino no conteúdo final.
Ainda assim, a escolha do narrador foi considerada "inadequada", especialmente por envolver uma criança com vínculos diretos com uma organização envolvida no conflito.
Segundo Davie, a BBC tomará medidas para aprimorar os critérios de apuração e transparência em futuras produções.
A Hoyo Films, produtora responsável, reconheceu o erro e afirmou que já tinha conhecimento do parentesco antes da veiculação, mas não repassou a informação à emissora.
O episódio reacendeu o debate sobre viés ideológico na cobertura do conflito entre Israel e o Hamas.
O ex-diretor da BBC Television, Danny Cohen, classificou o caso como "sintoma de um viés sistêmico" e alertou para a perda de credibilidade da emissora pública.
A secretária de Cultura do Reino Unido, Lisa Nandy, solicitou uma reunião com a direção da BBC e exigiu uma revisão rápida e rigorosa dos protocolos editoriais.
Ela classificou o episódio como um risco à confiabilidade da mídia e à transparência com os contribuintes britânicos.
A emissora ainda não informou se pretende editar e reexibir o documentário com outro narrador. Por ora, o conteúdo permanece fora do ar.
“A BBC News conduziu uma revisão inicial do programa Gaza: How to Survive a Warzone. Hoje, o Conselho da BBC foi atualizado sobre esse trabalho. A revisão identificou falhas graves na produção do programa. Algumas dessas falhas foram cometidas pela produtora, e outras pela própria BBC; todas são inaceitáveis. A BBC News assume total responsabilidade por essas falhas e pelo impacto que elas tiveram na reputação da Corporação. Pedimos desculpas por isso.
Nada é mais importante do que a confiança que nosso público deposita em nosso jornalismo. Este incidente prejudicou essa confiança.
Embora a intenção do documentário estivesse alinhada com nosso propósito — contar o que está acontecendo no mundo, mesmo nos lugares mais difíceis e perigosos — os processos e a execução deste programa ficaram aquém das nossas expectativas.
Embora o programa tenha sido produzido por uma empresa independente, contratada para entregar um documentário totalmente compatível com nossas diretrizes, a BBC possui responsabilidade editorial final sobre o conteúdo transmitido.
Uma das principais questões diz respeito às ligações familiares do jovem que narra o filme. Durante o processo de produção, a BBC perguntou por escrito diversas vezes à produtora independente sobre quaisquer conexões potenciais entre ele, sua família e o Hamas. Desde a exibição do programa, a produtora reconheceu que sabia que o pai do menino era vice-ministro da Agricultura no governo do Hamas; também reconheceram que nunca informaram esse fato à BBC. Foi uma falha da própria BBC não ter descoberto essa informação, e o documentário acabou sendo exibido.
A Hoyo Films nos informou que pagou à mãe do menino, por meio da conta bancária da irmã dele, uma quantia limitada pela narração. Embora a Hoyo Films tenha nos assegurado que nenhum pagamento foi feito a membros do Hamas ou seus afiliados, seja diretamente, em espécie ou como presente, a BBC está buscando garantias adicionais sobre o orçamento do programa e realizará uma auditoria completa dos gastos. Estamos solicitando os registros financeiros relevantes da produtora para isso.
Diante das falhas da própria BBC, o Diretor-Geral solicitou que as reclamações sobre este assunto sejam tratadas com prioridade pela Unidade de Reclamações Editoriais, que é separada da BBC News. Paralelamente, será conduzida uma revisão completa dos fatos; o Diretor-Geral solicitou que Peter Johnston lidere esse trabalho.
Peter Johnston, Diretor de Reclamações e Revisões Editoriais, é independente da BBC News e reporta-se diretamente ao Diretor-Geral. Ele avaliará todas as reclamações e questões levantadas. Ele determinará se houve violação de diretrizes editoriais; responderá rapidamente às reclamações recebidas; e permitirá que a BBC determine se alguma ação disciplinar é necessária em relação às falhas cometidas na produção deste programa. Isso incluirá questões relacionadas ao uso de linguagem, tradução e continuidade que também foram reportadas à BBC.
Não temos planos de retransmitir o programa em sua forma atual, nem de retorná-lo ao iPlayer, e faremos uma nova avaliação assim que o trabalho de Peter Johnston for concluído.”
Declaração do Conselho da BBC:
“O Conselho da BBC se reuniu hoje. O tema do documentário é claramente uma área legítima de investigação, mas nada é mais importante do que a confiança e a transparência em nosso jornalismo. Embora o Conselho reconheça que erros podem acontecer, os erros neste caso são significativos e prejudiciais à BBC.
O Conselho exigiu que a Diretoria Executiva apresente um relatório com os resultados do trabalho encomendado pelo Diretor-Geral o mais rapidamente possível.”
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