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Sua luta começou antes mesmo de subir em um octógono. Muito antes de lutar por cinturões, ele lutou contra o álcool.
Em entrevista, o campeão Alex Poatan relembrou os anos em que bebia todos os dias enquanto trabalhava em uma borracharia na periferia de São Bernardo do Campo
“Bebia quase um litro de cachaça por dia. Fiquei quatro anos treinando até conseguir parar de vez.”
A história de Poatan começa longe das luzes da arena. Filho de uma família simples, nascido em 1987, cresceu no bairro Batistini, uma região de ruas de terra e oficinas improvisadas. Começou a trabalhar aos 12 anos.
“Trabalhei desde os 12. Pneus de carro, caminhão, moto, trator, o que tivesse. Se eu fosse um bom lutador como era um bom borracheiro, seria o melhor”, disse.
A infância foi marcada por obrigações precoces. O menino que ajudava o pai como servente de pedreiro logo passou a sustentar parte da casa. A escola ficou em segundo plano.
“Nunca gostei de estudar. Parei na oitava série. Repeti quatro vezes. Não tinha expectativa de uma vida melhor”
O trabalho duro e o ambiente adulto da borracharia moldaram sua rotina e também o colocaram em contato com o álcool.
“A borracharia era um lugar de conversa. Os amigos passavam, ofereciam uma dose. E eu ia bebendo. Virou hábito.”
Aos 16 anos, já bebia diariamente. Aos 18, o consumo se tornou dependência.
“Eu queria parar, mas achava que conseguiria controlar. Ficava um mês sem beber, depois três, depois seis. Mas sempre voltava pior.”
O corpo resistia ao esforço, mas a mente perdia o foco. Ele recorda que durante o expediente, era comum que um colega trouxesse garrafas de cachaça A convivência com o álcool se tornou rotina.
A oficina, o bar, os amigos. “Eu bebia porque todo mundo bebia. E porque era fácil. Era o que tinha.” Sem estudos e sem perspectivas, acreditava que a borracharia seria o destino final. “Eu não imaginava nada. Não tinha sonho, não tinha plano. Só trabalhava e bebia.”
Foi o acaso que o levou a um novo caminho. Um dia, enquanto jogava futebol com amigos, se envolveu em uma briga.
“Um cara me deu uma ‘bica’ na perna. Fui pra cima e comecei a dar uns murros. Aí os amigos seguraram.”
O episódio chamou atenção de quem assistia. Os que estavam presentes incentivaram Poatan, dizendo que ele deveria começar a lutar. Poucos dias depois, ele procurou uma academia na vizinhança.
Treinou por 30 dias. Um mês depois, participou de um campeonato de boxe chinês e foi campeão.
“Treinei 30 dias e fui campeão. Ganhei, mas me machuquei bastante. Pensei: ‘Isso não é pra mim’. Parei e voltei pra borracharia.”
O breve contato com o esporte, porém, deixou uma marca. Quando tentou parar de beber novamente, lembrou da sensação de estar em um tatame.
“Voltei pra academia porque queria parar de beber. Queria ocupar a cabeça. Não falei nada pro mestre, só disse que queria treinar.”
O reencontro com o treinador aconteceu em uma nova academia, mais estruturada, no centro de São Bernardo. Poatan não tinha como pagar a mensalidade, mas o professor decidiu ajudá-lo.
“Ele usava a aula comercial pra me ensinar. Sem que os outros percebessem, me dava atenção especial. A prioridade era eu.”
A rotina mudou. Trabalhava na borracharia durante o dia e treinava à noite. Saía às cinco, pegava sua moto e seguia para a academia, onde fazia quatro treinos de uma hora cada. No entanto, sua alimentação continuava precária.
“Era coxinha, cachorro-quente, refrigerante. Tinha dia que bebia um litro de cachaça e ainda treinava.” Mesmo assim, o corpo respondia.
“Gostava do treino. Fiquei quatro anos treinando até parar de beber.”
As tentativas de abandonar o vício vinham em ciclos. “Queria só controlar. Ficava um mês, depois três, depois seis. Mas sempre voltava. Quando tentava de novo, voltava pior.”
A virada aconteceu em 2012, após uma derrota. Poatan percebeu que a bebida estava impedindo seu progresso e decidiu parar de vez.
“Assumi pra mim mesmo que não dava pra controlar. Parei. Desde 2012, nunca mais encostei na bebida.”
A mudança não foi imediata. Foram anos de esforço, repetição e disciplina. Durante esse período, os resultados começaram a aparecer. Em pouco tempo, Poatan conquistou títulos regionais e nacionais de kickboxing.
Durante o período, Poatan foi:
O desempenho chamou atenção da Confederação.
O apelido “Poatan” também nasceu nesse período. O nome, em tupi-guarani, significa “mão dura”. A referência é por causa da força dos golpes e da origem indígena da família. Ele carrega a palavra tatuada na mão esquerda.
O lutador reconhece que o percurso foi moldado pela necessidade. “Se eu tivesse tido oportunidade quando era moleque, talvez nunca tivesse bebido. Mas foi o que aconteceu. A luta me deu um caminho.”
No tatame, o borracheiro encontrou ordem e propósito. A repetição dos movimentos, o silêncio antes da luta e a rotina rígida substituíram a desorganização da oficina.
“O treino me ajudou a me concentrar. No começo, eu só queria parar de beber. Depois, percebi que queria ser bom nisso.”
O processo de transformação passou pela disciplina que o álcool havia corroído. “Eu tentava controlar. Depois entendi que tinha que parar de vez. Quando decidi isso, mudei.”
De borracharia em borracharia, ele acumulou mais de dez anos de trabalho pesado. Voltou várias vezes ao local de origem, mesmo depois da fama.
Numa dessas visitas, desafiou o antigo colega de oficina em uma prova de montagem de pneus.
“Ele fez em um minuto e pouco. Eu fiz em trinta segundos.”
O gesto tem valor simbólico: o lutador que um dia saiu da borracharia para tentar outra vida nunca rompeu completamente com o passado. A força que usa no ringue nasceu do mesmo esforço físico de levantar pneus e girar chaves de ferro.
Hoje, o atleta reconhecido mundialmente ainda se define com a simplicidade do borracheiro que era.
“Eu era bom de borracharia. Aprendi tudo lá. Se fosse tão bom lutador quanto era borracheiro, seria o melhor.”
A borracharia foi o primeiro ringue. O álcool, o primeiro adversário. E o esporte, o caminho de volta à lucidez.
A trajetória que começou em uma borracharia no ABC paulista levou Alex Poatan ao cenário internacional das artes marciais. Ainda hoje, ele recorda o período em que trabalhava em silêncio diante da bancada de oficina.
Sua história mostra a passagem de um ofício ao outro e o caminho percorrido entre o trabalho manual e o esporte profissional.
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