O Dom de Sabedoria
“O Dom de Sabedoria é um conhecimento das coisas de Deus impregnado de amor, graças ao qual a nossa alma ganha familiaridade cordial com as realidades divinas e chega a ter delas um conhecimento amoroso, delicioso e feliz”.
Essa citação foi retirada diretamente do livro Dons do Espírito Santo do Padre Francisco Faus que, por sua vez, estava citando São João Paulo II.
Faus descreve o dom da Sabedoria como um dos mais sublimes dos dons do Espírito Santo, um verdadeiro “saborear de Deus”. Ele compara esse dom a um gosto divino que transforma a alma, fazendo-a reconhecer as belezas, grandezas e mistérios do Criador com um prazer que transcende o entendimento humano.
Não é apenas um saber intelectual, mas uma forma de ver e saborear o Rosto de Cristo, a Palavra, a Vida e a Morte de Jesus com um êxtase espiritual. É como ser arrebatado pela contemplação, aquecido por uma união tão profunda com Deus que nos faz dizer, em palavras inspiradas de São Josemaria, algo como:
Esse dom nasce de uma alma dócil e aberta à ação do Espírito, que, no silêncio orante, permite que nosso ser interior se encante e se una a Deus. O olhar humano se expande e se torna divino: passamos a enxergar todas as coisas sob a luz de Deus, não mais pelos olhos do ego ou do medo, mas com clareza, reverência e admiração.
Leia o que Santo Agostinho escreveu em sua conversão:
“Tu, senhor, estavas comigo e eu não estava contigo. Brilhaste, resplandesceste diante de mim e expulsaste dos meus olhos a cegueira. Exalaste o teu espírito e aspirei o teu perfume e desejei-te, saboreei-te e agora tenho fome e sede de ti.”
O Dom de Entendimento
“Mediante o Dom de Entendimento, o Espírito Santo faz com que a nossa inteligência entenda de maneira lúcida, sem deturpações nem erros, o significado autêntico das verdades reveladas por Deus, transmitidas pela tradição apostólica, estampadas na Bíblia e conservadas e interpretadas fielmente pelo magistério da igreja. Sem esse dom do Espírito Santo, poderíamos saber de cor o teor literal dessas verdades, recitar o creio em Deus Pai e repetir pontos da Bíblia ou do catecismo sem nenhuma falha e, mesmo assim, não penetraríamos nessas doutrinas”.
Para Faus, o Dom do Entendimento é uma graça do Espírito Santo que vai além da simples inteligência humana. Não se trata de quanto sabemos, mas sim da capacidade de “ler por dentro” a realidade, contemplar os mistérios da fé e compreender o plano de salvação de Deus com o mesmo olhar amoroso e perspicaz d’Aquele que nos ama.
Ele destaca que esse dom nos permite:
- Penetrar nos desígnios divinos: mesmo sem entender tudo, somos capazes de captar com profundidade o que Deus faz no mundo e na história.
- Dar sentido à Palavra de Deus: iluminados pelo Espírito, tornamo-nos aptos a perceber valores, verdades e sentidos escondidos nas Escrituras e na vida de Jesus.
- Experimentar uma fé viva e consciente: a fé não é apenas acreditar, mas entender com o coração e experimentar a harmonia entre o que Deus revela e nosso caminho concreto.
“O que o Dom de Entendimento faz conosco é ascender a luz de Deus dentro de cada uma dessas verdades cristãs… o Dom de Entendimento transfigura as verdades da fé que já conhecemos e faz com que às vejamos com uma luminosidade clara e profunda.”
Faus reforça que o entendimento nasce de uma fé profunda e dócil ao Espírito. Sem essa disposição de humildade e abertura, a graça não frutifica.
Ele encoraja o leitor a rezar pelo dom de entendimento, pedindo ao Espírito que ilumine a mente, dissipe dúvidas e faça brotar no coração a certeza de que o que crê faz sentido e conduz à união com Deus.
Santa Teresa de Ávila descreveu em sua auto-biografia:
“É como se alguém, sem ter aprendido nem trabalhado nada para saber ler, nem mesmo estudado coisa alguma, se visse na posse de toda a ciência sem saber como, nem de onde veio. De um momento para outro, a alma se vê tão instruída no mistério da Santíssima Trindade e em outras coisas muito elevadas que não há teólogo com quem não se atreva a discutir sobre a verdade dessas grandezas.”
- Do misto entre a razão e as verdades reveladas nasceu a fé cristã. Leia nosso artigo sobre filosofia cristã e entenda a fundo seus principais conceitos.
O Dom de Ciência
Faus escreve que o Dom da Ciência é a luz que ilumina nossa visão da criação, não só para entendê-la intelectualmente, mas para ler nela os sinais de Deus e do Seu amor, no cotidiano e no extraordinário. Esse dom ensina a relacionar os fatos, tanto da natureza quanto da vida humana à providência divina e ao desígnio de Deus.
“Esse dom faz com que possamos enxergar com os olhos de Deus a finalidade, o significado e o valor da criação, da vida humana, da natureza, dos bens materiais, do nosso corpo, do sexo, da saúde, da dor, do prazer, do trabalho, do descanso, em suma, de todas as realidades deste mundo.”
Ele destaca três aspectos fundamentais:
- Ver Deus nas pequenas coisas, como a beleza de uma flor, de um rio ou o brilho de uma estrela, e ser levado por isso ao louvor e à gratidão.
- Descobrir a presença divina nos acontecimentos da vida, inclusive nas dores e humilhações, reconhecendo que tudo pode colaborar para o bem e purificação interior.
- Agir com sabedoria prática e espiritual, escolhendo aquilo que edifica, sejam situações, leituras, empregos ou relacionamentos com clareza sobre o que beneficia ou prejudica a vida de fé.
Para Faus, o Dom da Ciência não é conhecimento técnico, mas sabedoria prática, iluminada pelo Espírito, que orienta os olhos, coração e decisões. Ele convida a perguntar sempre: “Onde Deus está nisso?” e a viver de forma coerente com essa visão, amando, protegendo a criação e deixando-nos transformar pela ação divina.
O Dom de Conselho
Faus diz que o Dom do Conselho é uma luz interior que o Espírito Santo derrama na nossa consciência, auxiliando-nos a discernir as escolhas certas em cada momento da vida. É a graça que torna possível decidir com serenidade e sabedoria, segundo o coração de Deus.
Ele nos oferece uma “prudência superior”, guiando:
- O caminho a seguir: apontando quando avançar, recuar ou contornar dificuldades;
- As decisões a tomar: revelando o que nos edifica e o que devemos rejeitar;
- Como agir: fornecendo as atitudes e palavras certas para nós e para os outros.
“Mediante esse dom o Espírito Santo enriquece e aperfeiçoa a virtude da prudência, necessária para fazer escolhas e planos certos e para tomar decisões acertadas e ilumina interiormente a alma sobre o que devemos fazer, especialmente quando se trata de opções importantes. É como um sopro do Espírito Santo dentro de nossa consciência.”
Escreveu Faus, citando São João Paulo II.
Faus ressalta a importância de ser dócil ao Espírito: esse dom não funciona no imediatismo emocional nem na lógica humana estreita. Ele exige oração e um coração disposto a escutar, sem pressa, soberba ou lentidão.
Ele segue a tradição que o define como essencial para a vida espiritual comunitária, pois não apenas orienta a nossa consciência, mas também nos torna capazes de aconselhar os outros, imitando o Bom Pastor que guia suas ovelhas com firmeza e amor.
O Dom de Fortaleza
“É o dom que nos torna capazes de assumir com coragem as lutas necessárias para levar uma vida cristã.”
O Dom da Fortaleza é aquela força interior que o Espírito Santo desperta em nós para enfrentarmos as adversidades da vida com coragem, perseverança e fidelidade.
Para Faus, esse dom não é uma bravura humana, mas uma força sobrenatural. Ele sustenta os humanos quando sentem medo, fraqueza ou cruzes pesadas, tal como em situações de dor, injustiça ou dificuldade financeira.
Ele destaca que:
- A coragem do cotidiano não basta: esse dom é o “heroísmo da vida diária”, a força para continuar mesmo quando tudo insiste em silenciar nossa fé.
- Força na adversidade: nas tribulações, o Espírito nos dá paciência e serenidade, permitindo que transformemos desafios em oportunidades de crescimento interior.
- Testemunho corajoso: fortalece nossa voz e atuação na defesa da fé e da justiça, mesmo diante de zombarias ou perseguições.
Faus deixa claro que esse dom não se impõe sem nossa cooperação. Ele exige oração, fé confiada, docilidade ao Espírito Santo e prática das virtudes. É ele que nos permite perseverar e não vacilar, mesmo no silêncio das dores, porque o dom da Fortaleza é um sopro divino que ultrapassa a nossa capacidade humana.
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O Dom de Temor
Segundo Faus, o Dom do Temor de Deus não é medo insano do Criador nem pavor de punição, mas um respeito filial, uma profunda reverência ao contemplarmos a majestade, a santidade e a bondade do Pai. É um temor que nasce do amor e nos leva a não querer ofendê‑Lo.
Esse dom “abre os olhos à infinita grandeza e bondade de Deus Uno e Trino” e nos faz abismar numa adoração humilde, com receio de fragilizar essa relação por meio do pecado.
O Papa Francisco esclarece bem esse ponto:
O temor de Deus “não significa ter medo de Deus… é o dom do Espírito que nos recorda como somos pequenos diante de Deus e do seu amor… é o abandono com humildade, respeito e confiança em suas mãos”
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Esse dom traz consigo três efeitos principais:
- Consciência da grandeza de Deus: somos pequenos diante da santidade infinita do Senhor, o que gera em nós humildade, adoração e louvor silente.
- Repúdio ao pecado: com delicadeza e firmeza, ele nos impulsiona a evitar tudo que possa magoar ou decepcionar o Pai.
- Confiança filial: à semelhança de uma criança nos braços do pai, esse temor nos coloca em paz e docilidade, entregando‑nos com confiança ao cuidado divino .
“Esse dom não significa medo irracional, mas sentido da responsabilidade da fidelidade à lei de Deus e acrescentou que consiste sobretudo no temor de ofender essa pai boníssimo.”
O Dom de Piedade
Esse dom é dividido em duas meditações no livro da Faus: Piedade para com Deus e Piedade para com o próximo. Vamos apresentar cada uma.
O Dom de Piedade para com Deus
“É o dom que cura a dureza do nosso coração e o abre à ternura com Deus. Um dom que cria em nós sentimentos de carinho filial e de profunda confiança em Deus, a quem vemos como Pai providente e bom.”
O Dom da Piedade, quando voltado diretamente a Deus, é um impulso interior que faz amar o Pai com ternura filial, não por medo, mas por gratidão, reverência e confiança. Francisco Faus mostra que essa piedade não é sentimentalismo, nem se limita a gestos religiosos formais.
Trata-se de uma amizade real e constante com Deus, sustentada pelo Espírito Santo, que nos ensina a chamar “Aba, Pai” com o coração inteiro.
Esse dom nos leva a:
- Desejar estar com Deus: rezar não por obrigação, mas porque sentimos saudade do Pai;
- Obedecer com amor: ver os mandamentos como conselhos de um Pai sábio e não como imposições duras;
- Viver em ação de graças: reconhecer em tudo a mão de Deus, louvando-O nos pequenos e grandes acontecimentos do dia.
Faus convida a cultivar um relacionamento íntimo com Deus, em que cada ato do dia, trabalho, silêncio, sofrimento ou alegria pode se tornar oração. O dom da piedade transforma a fé em vida vivida na presença de Deus, com reverência, doçura e entrega.
O Dom de Piedade para com o próximo
“O dom de piedade nos comunica à ternura em forma de uma abertura autenticamente fraterna para com o próximo que se manifesta na mansidão. Ao mesmo tempo, extingue no coração todos os focos de tensão e de visão, tais como a amargura, a cólera e a impaciência e alimenta a alma com sentimentos de compreensão, tolerância e perdão.”
O Dom da Piedade, quando volta seu olhar para o próximo, é o que nos capacita a enxergar os outros como irmãos, filhos do mesmo Pai. Francisco Faus mostra que esse dom nos leva a um amor mais puro, cheio de compaixão, respeito e mansidão, afastando atitudes ríspidas, julgadoras ou indiferentes.
É um amor que nasce da intimidade com Deus: quanto mais reconhecemos a ternura do Pai por nós, mais somos levados a estendê-la ao outro. Isso significa:
- Acolher com doçura, sem arrogância ou superioridade;
- Perdoar com largueza, porque sabemos o quanto fomos perdoados;
- Servir com alegria, sem esperar aplausos nem retribuições;
- Sofrer com os que sofrem, não apenas com palavras, mas com presença e empatia.
Segundo Faus, essa piedade fraterna nos protege da frieza espiritual e do egoísmo travestido de devoção. Um cristão que reza, mas não acolhe o próximo, ainda não permitiu que o dom da piedade frutifique por inteiro em sua vida.