Em 9 de julho de 1932, São Paulo tornou-se o palco de um dos episódios mais marcantes da história brasileira: a Revolução Constitucionalista.
Após o assassinato a sangue frio de paulistas por apoiadores de Vargas, grande parte do estado se levantou e iniciou uma verdadeira guerra contra as tropas federais em busca de um país democrático, de uma Constituição e de mais soberania aos estados.
Batalhas de infantaria foram travadas, trincheiras montadas e as tropas federais bombardearam o estado de São Paulo em batalhas usando aviões militares.
O 9 de julho, hoje feriado estadual em São Paulo, simboliza a resistência cívica e militar contra o autoritarismo. Mais do que um conflito, a revolução foi um marco que influenciou mudanças políticas significativas, como a promulgação da Constituição de 1934.
Confira um resumo da Revolução Constitucionalista de 1932:
No início de 1932, o Brasil vivia um período de instabilidade política sob o governo provisório de Getúlio Vargas, que assumiu o poder após o golpe de 1930.
Esse golpe dissolveu o Congresso Nacional, suspendeu a Constituição de 1891 e centralizou o poder, nomeando interventores para governar os estados, muitas vezes ignorando lideranças locais.
Em São Paulo, principal polo econômico do país, essa perda de autonomia política gerou crescente insatisfação entre a elite, a classe média e setores populares. Os paulistas exigiam a redemocratização do Brasil, com a elaboração de uma nova Constituição, a realização de eleições livres e o fim do governo autoritário.
Nesse cenário de tensão, no dia 23 de maio de 1932, ocorreu um protesto em São Paulo contra a intervenção federal no estado.
A manifestação, organizada por grupos opositores ao governo Vargas, reuniu estudantes, profissionais liberais e outros cidadãos na Praça da República, próximo à sede do Partido Popular Paulista (PPP), uma organização contrária ao regime.
Durante o protesto, os manifestantes entraram em confronto com membros da Legião Revolucionária, um grupo de apoiadores de Vargas composto por tenentistas e simpatizantes do governo provisório. A situação escalou quando os legionários, armados, abriram fogo contra a multidão.
Quatro jovens – Mário Martins de Almeida, Euclides Miragaia, Dráusio Marcondes de Sousa e Antônio Américo Camargo de Andrade, conhecidos pela sigla M.M.D.C. – foram baleados e mortos no confronto. Um quinto jovem, Orlando de Oliveira Alvarenga, também foi ferido e morreu semanas depois, mas as iniciais dos quatro primeiros se tornaram o símbolo mais marcante do movimento.
As mortes dos quatro jovens causaram comoção imediata em São Paulo. Eles foram rapidamente transformados em mártires da causa constitucionalista, galvanizando a população em torno da luta por democracia.
A sigla M.M.D.C. passou a ser usada como um grito de guerra, estampada em bandeiras, cartazes e até no nome de uma organização civil que coordenou esforços para a revolução.
O enterro dos jovens foi acompanhado por milhares de pessoas, em um momento de luto coletivo que intensificou o sentimento de revolta contra o governo Vargas.
O episódio de 23 de maio foi o estopim que transformou a insatisfação política em ação concreta.
Ele uniu diferentes setores da sociedade paulista – desde a elite cafeeira, que financiou o movimento, até estudantes, operários e mulheres, que participaram ativamente.
Nos dias e semanas seguintes, a mobilização cresceu, com a formação de comitês, arrecadação de fundos (como a campanha “Ouro para a Vitória”, que coletava joias e recursos para a causa) e alistamento de voluntários para o confronto armado.
Essa onda de engajamento culminou no levante de 9 de julho de 1932, quando São Paulo, sob a liderança do governador Pedro de Toledo e com apoio de figuras políticas e militares, declarou guerra ao governo federal.
Os objetivos militares declarados pelas lideranças de São Paulo não eram dominar o Brasil ou estabelecer um governo separado, mas sim resistir ao governo Vargas e forçar negociações para a redemocratização do país, incluindo a convocação de uma Assembleia Constituinte e a restauração da autonomia estadual.
Por mais que grupos de outros estados tenham realizado manifestações pontuais contra Vargas, não houve apoio militar significativo de grupos sociais e de governos estaduais.
A estratégia militar inicial era defensiva: proteger o território paulista, controlar pontos estratégicos e impedir o avanço federal até que a pressão política surtisse efeito, conforme o livro A Revolução Constitucionalista de 32 de Hernâni Donato.
São Paulo mobilizou cerca de 35.000 a 40.000 homens, segundo estimativas de Domingos Meirelles, incluindo soldados regulares da Força Pública (polícia estadual), militares dissidentes do Exército e voluntários civis, muitos sem treinamento formal.
A liderança militar ficou a cargo de oficiais como o coronel Euclides Figueiredo e o general Isidoro Dias Lopes. Os paulistas contavam com armamento leve (fuzis e revólveres), algumas peças de artilharia e aviões improvisados, mas enfrentavam escassez de munições e recursos logísticos.
As forças federais, sob o comando de generais como Góes Monteiro, reuniram cerca de 100.000 homens, incluindo tropas do Exército, Marinha e milícias aliadas de outros estados. Eles tinham superioridade em armamento, com tanques, aviões e acesso a suprimentos contínuos. O governo Vargas também controlava a infraestrutura ferroviária e portuária, dificultando o abastecimento paulista.
Os paulistas adotaram uma estratégia defensiva, estabelecendo um perímetro de defesa ao redor do estado para proteger a capital e os principais centros econômicos.
Esse perímetro incluía linhas fortificadas em áreas estratégicas, como o sul (fronteira com o Paraná), o norte (fronteira com Minas Gerais) e o leste (Vale do Paraíba, próximo ao Rio de Janeiro).
Trincheiras foram cavadas em locais como Itararé, Cruzeiro e Cunha, e barricadas foram erguidas para atrasar o avanço inimigo.
No sul do estado, a Batalha de Itararé foi um dos primeiros confrontos significativos. Os paulistas fortificaram a região, que era um ponto de passagem da estrada de ferro São Paulo-Rio Grande, visando bloquear a entrada das tropas federais vindas do Paraná.
Segundo Hélio Silva, no livro 1932: A Guerra Paulista, os paulistas usaram táticas de emboscada e fortificações improvisadas, aproveitando o terreno montanhoso para dispararem do alto contra os inimigos.
No entanto, a superioridade numérica e o uso de artilharia pesada pelas forças federais forçaram a retirada paulista após dias de combates intensos. Apesar da derrota, a resistência em Itararé atrasou o avanço federal, dando tempo para São Paulo organizar outras frentes.
O Vale do Paraíba, principal corredor entre São Paulo e Rio de Janeiro, foi o teatro de guerra mais importante. Os paulistas estabeleceram uma linha de defesa ao longo de cidades como Cruzeiro, Lorena e Pindamonhangaba, cavando trincheiras e posicionando atiradores em colinas.
O objetivo era impedir que as forças federais, avançando do Rio de Janeiro, chegassem à capital paulista.
As batalhas no Vale foram marcadas por combates de infantaria, com os paulistas usando táticas de guerrilha, como ataques rápidos e sabotagem de linhas férreas. Os voluntários mostraram determinação apesar da falta de treinamento, mas a escassez de munições e a fadiga começaram a minar a resistência.
As forças federais adotaram uma estratégia de cerco progressivo. Segundo Donato, elas avançaram em pinça, com tropas vindas do Rio de Janeiro pelo Vale do Paraíba, do Paraná pelo sul, e de Minas Gerais pelo norte, cercando São Paulo em um arco.
A Marinha bloqueou o porto de Santos, cortando o acesso a suprimentos externos. Esse cerco gradual desgastou os paulistas, que não conseguiram manter linhas de suprimento eficientes.
No norte, em Campinas e na região de São José do Rio Pardo, houve combates esporádicos, mas os paulistas não conseguiram conter as tropas mineiras, que avançaram lentamente.
No oeste, próximo a Presidente Epitácio, os paulistas tentaram uma ofensiva contra Mato Grosso, mas a falta de apoio logístico limitou o sucesso. Essas frentes secundárias tinham o objetivo de distrair as forças federais, mas não alteraram o curso do conflito.
As batalhas combinaram táticas convencionais e improvisadas. Os paulistas usavam artilharia leve e metralhadoras em posições fixas, mas dependiam muito de voluntários que aprendiam no campo.
Inspiradas na Primeira Guerra Mundial, as trincheiras eram comuns, mas muitas eram rudimentares, feitas de terra e madeira.
As forças federais, mais bem equipadas, empregavam bombardeios aéreos limitados e tanques leves, além de táticas de flanqueamento para romper as defesas paulistas.
Não há um número exato de mortos, mas estimativas de historiadores como Hernâni Donato apontam cerca de 2.000 a 2.500 mortes no total, incluindo combatentes e civis.
Desse total, aproximadamente 800 a 1.000 eram paulistas (soldados e voluntários), e o restante, federais e civis atingidos por combates ou bombardeios.
A falta de registros precisos se deve à desorganização do conflito e à ausência de um censo oficial. Feridos e prisioneiros somaram dezenas de milhares, com muitos paulistas exilados após a rendição.
Em setembro de 1932, o cerco federal se intensificou, e São Paulo ficou isolado. A capital foi ameaçada, e, em 2 de outubro, os líderes paulistas assinaram a rendição em Lorena, encerrando o conflito.
Apesar da derrota militar, a resistência pressionou Vargas a convocar a Assembleia Constituinte, resultando na Constituição de 1934.
A Revolução Constitucionalista de 1932, embora tenha sido uma derrota militar para São Paulo, gerou consequências significativas. Entenda as principais consequências, as ações do governo federal e as repercussões locais e nacionais.
O governo de Getúlio Vargas lidou com São Paulo de forma estratégica, combinando repressão seletiva com gestos de conciliação para evitar novos levantes e manter a unidade nacional.
Segundo Boris Fausto, Vargas reconheceu que a revolta, apesar de centrada em São Paulo, refletia insatisfações mais amplas e uma repressão excessiva poderia inflamar outros estados.
Após a rendição, o governo federal dissolveu o governo estadual liderado por Pedro de Toledo, nomeando interventores leais a Vargas para governar São Paulo. Líderes militares e civis do movimento, como o general Isidoro Dias Lopes e o coronel Euclides Figueiredo, foram presos ou exilados.
Estima-se que cerca de 5.000 pessoas, incluindo combatentes e apoiadores, foram detidas, muitas enviadas para presídios como a Ilha Grande, no Rio de Janeiro, conforme descrito por Donato. No entanto, a repressão não foi indiscriminada; Vargas evitou punições em massa para não alienar a população paulista.
Para apaziguar São Paulo, Vargas nomeou interventores moderados, como Armando de Sales Oliveira, em 1933, que era aceitável para as elites locais.
Essa escolha sinalizou uma tentativa de reconciliação, permitindo que São Paulo recuperasse gradualmente influência política. Além disso, Vargas anistiou muitos prisioneiros políticos em 1934, reduzindo tensões.
A revolução, embora derrotada militarmente, alcançou seu principal objetivo político: pressionar o governo Vargas a convocar uma Assembleia Constituinte. Esse foi o impacto mais duradouro do movimento.
A pressão exercida por São Paulo, combinada com outras insatisfações regionais, levou Vargas a anunciar eleições para uma Assembleia Constituinte em 1933.
A Constituição de 1934, promulgada em julho daquele ano, trouxe avanços significativos, como:
Segundo Fausto, a Constituição de 1934 refletiu um compromisso com o federalismo, atendendo parcialmente às demandas paulistas por maior autonomia estadual.
Em São Paulo, a revolução deixou um legado ambíguo: derrota militar, mas fortalecimento do orgulho cívico e da identidade paulista.
O conflito causou prejuízos econômicos significativos. A mobilização para a guerra, incluindo a campanha “Ouro para a Vitória” (que arrecadou joias e recursos), drenou as finanças estaduais.
O bloqueio do porto de Santos pelas forças federais interrompeu exportações de café, principal produto de São Paulo, afetando a economia local. Além disso, cidades como Campinas e Cruzeiro sofreram danos materiais devido aos combates.
Segundo o historiador Hernâni Donato, a recuperação econômica foi lenta, mas São Paulo manteve sua posição como motor econômico do Brasil.
Apesar da derrota, a revolução fortaleceu o senso de identidade e unidade em São Paulo. A sigla M.M.D.C. (Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo) tornou-se um símbolo de resistência, e o 9 de julho foi instituído como feriado estadual, celebrado até hoje.
Monumentos, como o Obelisco do Ibirapuera, e memoriais foram erguidos para homenagear os combatentes. A participação de voluntários, incluindo mulheres que atuaram como enfermeiras e organizadoras, reforçou a narrativa de um estado unido por ideais democráticos.
Nem todos em São Paulo apoiaram a revolução. Setores operários e grupos alinhados a Vargas, como a Legião Revolucionária, opuseram-se ao movimento, criando tensões locais. Essas divisões persistiram no pós-guerra, com debates sobre o papel de São Paulo na federação.
Embora a Constituição de 1934 tenha sido substituída pela ditadura do Estado Novo em 1937, quando Vargas dissolveu novamente o Congresso e centralizou o poder, o legado da Revolução Constitucionalista persistiu.
A revolução plantou sementes para a redemocratização do Brasil na década de 1940. A Constituição de 1946, que marcou o fim do governo Vargas, retomou muitos princípios de 1934, como o federalismo e o bicameralismo, consolidando o Senado como representante dos estados.
Além disso, a revolução reforçou a importância de São Paulo no cenário político nacional, garantindo que o estado permanecesse uma força influente nas décadas seguintes.
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