Matrix é um dos maiores clássicos da ficção científica, foi o filme que reuniu quase tudo o que há do mundo Cyberpunk e conseguiu sintetizar isso numa obra que conquistou uma enorme influência cultural.
Muita gente foi influenciada por Matrix. Foi um filme que realmente marcou sua época. Representou um marco: o fim da era da ficção científica, que era muito forte no cinema nos anos 90.
As principais influências de Matrix foram:
É visível todas as influências que exerceram no filme Matrix.
A história contada é a de Neo, também conhecido como Thomas Henderson. Seu nome vem de Tomé, o apóstolo que duvidou da ressurreição de Cristo. E o sobrenome Henderson significa “filho do homem”. O personagem Neo é uma mistura desses dois significados.
O protagonista, ao longo da história, mostra-se um sujeito cético com esse despertar para a Matrix.
Existem ainda outras camadas de significados para o nome do protagonista. Neo significa novo, portanto ele é o novo homem. Mudando a ordem das letras, ele torna-se One, o um, o escolhido.
Essa ideia de escolhido utiliza-se muito do imaginário cristão. Neo é associado à figura do Cristo várias vezes. Embora isso seja misturado com outras tradições religiosas, como o budismo.
A principal influência de Matrix é a filosofia pós-moderna. Os diretores leram muito Baudrillard e foram muito influenciados por suas ideias. Os principais filósofos pós-modernos que influenciaram a obra foram:
No início do filme há uma cena em que Neo está deitado em seu quarto, usando seu fone de ouvido, há uma grande quantidade de estímulos externos variados. O protagonista está na iminência entre o sono e o despertar.
A questão refletida nesta cena é se a pessoa é capaz de distinguir o mundo real do mundo dos sonhos. Isto é um preceito de Descartes.
Alguns estímulos são capazes de levar à apatia, de modo que a pessoa não sabe mais diferenciar o que é real e o que não é. Esta é uma ideia tirada do Baudrillard.
O filósofo tem um livro que inspirou muitas ideias e cenas do filme Matrix. A obra se chama Simulacros e Simulação. Logo no começo do filme, Neo pega esse livro de sua estante. Ele abre, mas dentro há um CD.
O CD provavelmente é de simulação, o livro é falso. O que remete a ideia de Baudrillard de que a cultura atual deixa as pessoas apáticas inundando-as de informações. Como resposta, elas buscam constantemente essas simulações de realidade.
Desse modo, as pessoas vão sendo cada vez mais imersas nesses simulacros. Toda essa ideia presente no Matrix são frutos da leitura dos diretores de Baudrillard.
Neo recebe o chamado para acordar, um despertar por meio do computador. Para que isto aconteça, há um código na máquina. O código remete à ideia de Baudrillard, de binarismo, como isto condiciona as pessoas na estrutura. O horizonte de expectativa das pessoas é uma visão limitada por um sistema.
A matrix em si tem um código, ele salta na tela constantemente, em verde neon, descendo. O código que reforça essas ideias de Baudrillard.
Phillip K. Dick, importante autor de obras de ficção científica, apresenta várias vezes essa ideia da sutil distinção entre homens e máquinas. Com certeza, ele foi uma forte influência para o enredo do filme.
Existem diversas cenas em que Neo vive aquela realidade alienante. Por exemplo, quando ele está no trabalho, seu chefe é uma figura de autoridade que é extremamente alienante. Portanto, a autoridade representa esse mal e essa alienação.
Neo deseja fugir para descer no Buraco do Coelho, ideia de Lewis Carrol que está no filme também. Este ato é representado pela escolha da pílula azul ou vermelha.
Todo o mundo de Matrix é falso, as máquinas se alimentam dos homens para retirar sua energia, esta ideia é bem interessante no enredo. Indo além: como é possível distinguir na história o que é realidade o que não é?
Como distinguir percepção e visão intelectual, uma ideia muito burkleyana. Passa-se a impressão de que o homem não é mais capaz de perceber o que é realidade e o que não é.
A filosofia moderna e a pós-moderna costumam vagar por esses temas.
Neo vaga entre dois mundos: seu escritório, uma estrutura opressiva, e seu trabalho como hacker. O protagonista vive perambulando por esses dois mundos. Todos os colegas do Neo tem nome de hackers porque eles são as pessoas que quebram o código e o sistema.
As pessoas estão presas no sistema, no binarismo, e os hackers são capazes de quebrar toda essa estrutura. Por isso, Neo tem essa vida dupla, fato simbólico para toda a história.
O agente representa o símbolo da autoridade, tal como o chefe de Neo, eles lutam para manter o sistema. São diversos personagens que simbolizam essa autoridade e lutam para manter o sistema.
No final do filme, aparecem diversas frases “de um mundo sem limites”, o Neo se libertou de fato, escapou do código e da estrutura de dominação. Há uma clara influência marxista nessas ideias.
A Matrix é uma sátira do sistema capitalista, portanto os diretores tentam constantemente transmitir a mensagem da necessidade de se libertar deste mecanismo. A trilha sonora reforça esse viés de libertação com músicas do Rage Against the Machine. Uma banda que conta com muitas músicas com essas ideias de libertação, de pautas de esquerda.
Ao mesmo tempo, há a figura do Messias no filme. O homem que será responsável por libertar a humanidade. Mas a libertação será da influência das máquinas, as pessoas servem ao seu sistema.
No Matrix, as pessoas nascem dissociadas do nascimento natural, assim como no livro Admirável Mundo Novo. Esta é uma ideia preocupante, parece que o filme defende essa criação artificial, junto de outras teorias da pós-modernidade.
Eu não defendo nunca uma ideia dessas, sou um cristão realista, mas acho bem interessante essa discussão que o Baudrillard apresenta.
É importante entender realmente as ideias que a obra apresenta. Não me parece que há uma visão cristã no Matrix como alguns tentam enxergar. O filme é cheio de elementos sincréticos, principalmente do budismo.
Existe a figura do Oráculo, uma figura feminina que tudo conhece, tudo vê. Ela apresenta um pouco aquela ideia do “conhece-te a ti mesmo”.
Outro elemento sincrético - até gnóstico - que aparece no enredo de Matrix são os poderes de Neo. Ele é capaz de quebrar a ilusão do mundo das máquinas com seus poderes e manipula a matéria, eliminando a distinção entre pessoa e objeto.
Muitas filosofias pós-modernas entram nesse campo de quebrar as barreiras entre pessoa e objeto.
Além disso, Neo é o responsável por acabar com o mundo falso - o mundo sensível - e abrir a visão das pessoas ao mundo verdadeiro. Neste sentido, ele também é uma espécie de Messias, mesmo que com essas ideias gnósticas.
É curioso notar que apesar das ideias centrais da obra, Matrix também tem um elemento realista embutido na história. O próprio Baudrillard odiou essa parte, tornando-se crítico do filme. Para o filósofo, suas ideias defendem a fuga do binarismo, mas nas suas ideias o real e o irreal são elementos misturados. No filme, porém, permeia uma ideia platônica.
A cena da pílula vermelha e a azul explica isso. As pessoas podem escolher entre cair na realidade ou viver no erro. Neste ponto, o Mito da Caverna é a referência principal, e não as ideias de Baudrillard.
Esse é um elemento bem realista da trilogia.
Aliás, a pílula vermelha se tornou sinônimo de despertar para ideias à direita na internet. Mencius Moldbag, pensador neo reacionário, cunhou esse termo no seu blog Unqualified Reservations.
Voltando ao Matrix, esse ponto da pílula vermelha é o mais realista da história. É possível perceber um simbolismo cristão face à luz desta pílula. O Cristianismo e o Platonismo tem essa dimensão de despertar para um mundo inteligível, aquele além do sensível.
Esse é o ponto de realismo da obra, mas ele está entrelaçado aos diversos outros apresentados. O Matrix tem diversos níveis de simbolismo, é importante se atentar a isso ao interpretá-lo.
Frequentemente o filme está debochando das distinções entre o real e o ilusório e de todas as formas de alienação.
Há uma cena em que o Reagan, personagem que traiu o grupo principal, está bebendo e ele compartilha seus desejos de riqueza, mesmo que esta seja adquirida no mundo falso de Matrix. Isso tudo é alienante, faz o homem fugir das distinções entre o real e o imaginário.
Na visão dos criadores do filme, a mensagem seria para fugir desses apegos do mundo moderno.
Matrix no cômputo geral é um filme pós-moderno, mas que tem uma pitada de realismo. Sou um grande crítico da pós-modernidade, mas a obra realmente vale a pena. Ele representa o raciocínio de uma estrutura simbólica cuidadosamente construída em torno das ideias dos filósofos que citei.
Essa ideia de sair da realidade ilusória, de um mundo alienante, que bombardeia estímulos e sensações que vão tornando as pessoas apáticas à realidade, são pontos do filme que concordo.
O Matrix apresenta diversos símbolos que são desprovidos de significado no real, algo que realmente acontece nos dias de hoje. Só não acho que o caminho seja o do Rage Against the Machine. No fim das contas, há um aprendizado valioso nesse filme.