Guilherme Freire
O que há de errado com o mundo?
O que há de errado com o mundo?

Distopia ou realidade?

Por 
Guilherme Freire
12/5/2022
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1984, Admirável Mundo Novo, Senhor do Mundo, são exemplos de livros que criam Distopias. É surpreendente o tanto que as previsões negativas de alguns desses autores se concretizam hoje.

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O que é uma Distopia? Para entender o conceito, é necessário compreender o que é a utopia. A Distopia é, de certo modo, sua inversão.

A palavra utopia quer dizer um governo ideal, segundo a terminologia popular. O conceito original não foi cunhado com este sentido. O termo inicialmente remete à obra de Thomas More. Mas a utopia criticada pelas distopias não é exatamente a de More.

No seu livro Utopia, Thomas More está querendo fazer uma espécie de Atlântida, semelhante à que Platão criou em uma de suas críticas.

Platão tem esse diálogo em que apresenta Atlântida como uma espécie de cidade pagã ideal. Pagã no sentido em que não é cristã, mas é uma cidade em que não há nenhum vislumbre das ideias divinas. Atlântida se contrapõe a Atenas Antiga.

Atenas é a cidade antiga que vislumbra o divino e, portanto, é a mais perfeita. Mas aqui Platão faz uma ironia.

Atlântida é inimiga de Atenas e, mesmo não cultuando os deuses, a cidade possui valores e uma perfeição humana. Eles têm virilidade, força de vontade, engenho e outras coisas. Um aspecto de perfeição humana.

Mas a Atenas antiga tem uma perfeição divina, porque vislumbra as ideias platônicas. Mas a Atenas nova, na qual Platão vive e a qual ele critica, está aquém da Atlântida.

Platão, com isso, está ironizando a Atenas atual, mostrando sua inferioridade em comparação a um inimigo. Assim, seu escrito apresenta essas três realidades distintas de cidades.

A Utopia de Thomas More toma o mesmo caminho. Ele entende o ideal de Estado como um Estado católico, inspirado pelo monasticismo, como é exposto na obra Formação do Príncipe, de Erasmo.

More compreende a importância de alguns valores renascentistas e humanistas de seu tempo, mas ele entende que o Estado perfeito ainda seria o cristão.

More segue o mesmo caminho de Platão, valendo-se do recurso da ironia. A ilha de Utopia é inspirada em Atlântida e é uma representante do Renascimento.

Com ela, o autor queria mostrar o limite do pensamento renascentista. Existem coisas na Utopia que seriam reprováveis para a audiência da época de More. Isto é uma forma dele de mostrar que as ideias renascentistas tem um limite, porque elas não têm um elemento divino por trás.

Ao mesmo tempo, a ironia consiste em mostrar que a ilha apresentava elementos superiores ao pretenso Estado cristão da época.

Thomas More viveu na época de Henrique VIII. Para o autor de Utopia, o Estado praticamente não vive nenhum aspecto do cristianismo. Portanto, estão aquém dos inimigos da própria sociedade.

Ou seja, a ideia de utopia é uma espécie de inversão do governo e da sociedade ideal.

O conceito de utopia como governo ideal, definição do termo que se popularizou, é fruto de uma literatura mais progressista da história.

Em um período não tão díspar do de Thomas More, vão surgir aqueles que realmente acreditam que o progresso tecnológico pode sanar todos os problemas sociais. Francis Bacon, por exemplo, criou uma nova Atlântida.

Uma em que o progresso vai sanar todos os males da humanidade, o mundo será curado pelo progresso científico. A nova Atlântida do Bacon já é uma utopia na acepção mais popular do termo. Em que o progressismo da história vai acabar com os problemas.

Bento XVI colocou de forma muito interessante Francis Bacon como um dos pais do Progressismo.

Isso vai apresentar vários reflexos na história, várias utopias na linha do Bacon vão surgir.

No começo do século XX surge a figura do H.G. Wells. Wells vê o socialismo, as ideias modernas e a tecnocracia como a solução definitiva para acabar com os problemas da humanidade. Criando um paraíso terreno, tecnológico, em que os problemas sociais vão se dissipar pela força do progresso científico e das ideias revolucionárias.

Isso choca várias pessoas da época porque muitos estão vendo que a realidade estava tomando outro caminho. Na verdade, o progresso mostrava que podia muito bem ser assustador.

O progresso científico pode aumentar os mecanismos de controle. Criando um mundo onde:

  • as pessoas são cada vez mais vigiadas;
  • a vida é permeada por incertezas;
  • a vida é manipulada em todos os níveis;
  • as liberdades mais básicas são cerceadas sob o pretexto de inimigos ilusórios.

É nesse momento que se alcança o que é a Distopia, a inversão da utopia de Bacon. Associa-se ciência, progresso e mudança de costumes, em uma via opressiva de controle.

A distopia

H.G. Wells é um socialista fabiano. O socialismo fabiano tinha dois símbolos:

  1. a tartaruga, que representa um socialismo que se implementa lentamente;
  2. o lobo em pele de cordeiro, aquele socialismo que finge ser outra coisa, para se aproximar da vítima.

Essa ideia de fabiano tem origem no general romano Fábio. Ele elaborou uma estratégia de avanços lentos e graduais para enfrentar o cartaginês Aníbal. A estratégia consistia em cercos discretos, em limitar a comida do adversário aos poucos.

Desse modo, surgiu o socialismo fabiano, que pregava uma lenta transformação da política.

O socialismo, como é defendido hoje, tem como uma de suas ferramentas essa visão de um futuro maravilhoso, tecnológico e que aos poucos vai sendo implementado.

Com a literatura distópica, vários escritores vão apontar que a sociedade não está evoluindo para essa linha socialista, progressista, tecnológica. O mundo não está indo para um caminho maravilhoso, paradisíaco, mas sim um caminho assustador.

Um dos primeiros livros nessa linha é o Conto sobre o Anticristo, de Vladimir Soloviev. O autor é um dos mentores intelectuais do Dostoiévski, ele escreve este conto que narra o advento do Anticristo por meio das novidades modernas. O Soloviev já tinha essa visão distópica no início do século XX, é o pioneiro dessa ideia.

O livro seguinte é O Senhor do Mundo, que também trata do Anticristo, por mais que a palavra não apareça explicitamente no livro. O livro trata de um senador americano moderno que se une à União das Repúblicas Socialistas Europeias.

Os países europeus adotam um socialismo secular que se funde com aquele tecnocrático. Há na história também um período de dominação chinesa.

Esse senador americano unifica a visão chinesa com o socialismo europeu, com o progressismo da elite de managers americanos e se torna o líder de todas as coisas.

O senador é aclamado como um libertador que trouxe a paz mundial, por meio de uma visão relativista e moderna.

O engraçado é que o livro O Senhor do Mundo prevê coisas como avião bombardeiro, algo que não existia na época em que foi escrito. Ele prevê vários tipos de armas de destruição em massa, ele tem esse viés de previsão tecnológica.

O livro foi escrito por Robert Hugh Benson, filho do arcebispo de Canterbury, figura muito influente no início do século XX. Benson espalhou pela Inglaterra a cultura distópica.

Nessa linha surge Aldous Huxley, com Admirável Mundo Novo. Um livro dos anos 1930 que descreve um monte de coisas que foram acontecer no mundo atual:

  • contracepção;
  • drogas;
  • controle de natalidade;
  • manipulação genética;
  • divisão em classes;
  • uso do prazer para controle da população;
  • técnicas de manipulação de massa;
  • mudança da linguagem.

A própria forma como os personagens da história alteram o real sentido de termos como socialismo, fascismo, fordismo, remonta ao mundo atual.

Aldous Huxley apresenta uma curiosidade importante: ele era membro dos grupos globalistas, sua família também estava envolvida nisso. Ele era um insider dando insights daquilo que defendia.

Por fim, George Orwell, um autor posterior, que teve a experiência do comunismo na Guerra Civil Espanhola. Ele faz uma apresentação desses males do comunismo em sua obra 1984:

  • como ele altera a linguagem;
  • como ele inverte os nomes;
  • como existem essas telas em que as pessoas falam por meio delas, mas também são observados por elas.

Essa literatura distópica é extremamente profética e oferece um caminho para entender o que está acontecendo com o mundo hoje. Para se prever o futuro e entender os impactos da tecnologia e dos mecanismos de controle num mundo confuso.

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