Bolsonaro no Conversa Paralela
Arthur Morisson
Área Restrita - Sou responsável pelo que escrevo, não pelo que você entende.
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E se Bolsonaro fosse no Conversa Paralela?

Por 
Arthur Morisson
23/8/2022
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Imagine a cena: terça ou quinta à noite, às 20h, você liga a TV e sintoniza na BP para assistir ao seu podcast favorito (o favorito da Renata Viana também). A vinheta surge, aquela musiquinha animada, Lara aparece dando boa noite e me cumprimenta. Eu respondo, fazemos uma brincadeirinha ali entre nós e em seguida apresentamos nosso convidado da noite, o atual Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro.

Imaginou? Agora pense em como eu e Lara conduziríamos essa conversa.

Você já sabe onde eu quero chegar, certo?

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Bolsonaro no Conversa Paralela

Ontem, o atual presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro, foi sabatinado no Jornal Nacional, o telejornal de maior audiência do país.

Mas o que vimos está longe de ser considerado uma entrevista, está mais para um tribunal televisionado.

Veja bem, não se trata de defender o político de estimação X ou Y. Para quem tem o mínimo de bom senso, o absurdo que aconteceu em rede nacional foi escancarado.

Perguntas mal formuladas e desonestas, tom excessivamente provocativo, apelo constante à emoção do telespectador, acusações, dramatizações, expressões de soberba e autoridade, interrupções todas as vezes que o presidente falava sobre os feitos de seu governo. Um teatro de horrores travestido de jornalismo.

Se recusaram até mesmo a chamar um presidente em exercício de, pasmem, presidente!

Não se viu tamanho desrespeito perante um convidado nem mesmo quando a Globo entrevistou o goleiro Bruno ou Suzane Richthofen.

Chega a ser cômico como o Bonner, um jornalista ao qual eu estimava quando era adolescente e o via como símbolo de profissionalismo e autoridade, tenha se prestado a fazer um papel tão infantil. 

Vai ver eu só era um jovem iludido e sem qualquer discernimento mesmo e não me dava conta que ele já era assim antes. Acontece.

Será que a arrogância apresentada seria a mesma caso o entrevistado fosse um certo ministro do Supremo? Tudo leva a crer que não.

Existe motivo pra isso?

Além de especulações, não sabemos ao certo o que se passa no núcleo jornalístico da emissora mais famosa do país ou quais as reais intenções da alta cúpula.

Mas eu tenho um bom palpite para o que aconteceu ontem. Olhe essa tabela:

lucro-globo
Esses números podem até não justificar, mas explicam muita coisa.

Quando dói na audiência e – consequentemente - no bolso, os motivos aparecem.

E falando em audiência, houve um pico durante os 40 minutos da entrevista.

37 pontos contra 24 e 24,5 pontos nas últimas noites. Na segunda da semana passada, a média foi de 26,5 pontos, 10 pontos a menos que o pico de ontem.

Para quem está desacostumado com essa linguagem, cada ponto vale aproximadamente 78 mil domicílios. Lembrando que cada lar conta com 2, 3, 4 pessoas. Faça as contas.

É indiscutivelmente inegável a popularidade de Bolsonaro.

Quando a entrevista acabou, o ibope caiu para 25 pontos, a média "normal" do telejornal da Globo.

O jornalismo respira por aparelhos

Há quem diga que o jornalismo morreu e esqueceram de enterrar.

Eu já sou mais otimista. Para mim, o jornalismo brasileiro está em coma.

E se ele ainda não partiu dessa para uma melhor (ou pior, vai saber) é por conta de poucos jornalistas sérios que, sozinhos, conquistaram seu espaço e souberam agir com profissionalismo mesmo diante de situações desconfortáveis.

Destaco dois, que cresceram e se consolidaram pela internet, conquistando um espaço tão grande a ponto de fazer inveja aos grandes comunicadores da TV: Igor 3k e Rica Perrone.

Selecionei os dois por motivos óbvios. Assim como na Rede Globo, Bolsonaro também foi entrevistado no Flow e no Cara a Tapa, canais de Igor e Rica, respectivamente.

E o que se viu foi totalmente diferente. Uma conversa leve, respeitosa, com momentos de tensão e debate, mas sem perder o foco e a imparcialidade que um evento como esse necessita. Igor e Rica foram pressionados por uma turma barulhenta, que ousaram dizer que faltou “atacar mais o presidente”, como se este fosse o objetivo de uma entrevista.

Foram xingados por se prestarem a fazer o único papel que um jornalista no lugar deles deveria fazer em uma entrevista: entrevistar.

Porque pode sentar o Lula ou o Bolsonaro naquela cadeira que eles tratarão o convidado com o mesmo respeito e seriedade que a entrevista pede. Porque eles sabem que, se passarem do ponto e agirem conforme suas paixões, as chances de um ou outro entrevistado se levantar e deixar o programa são altíssimas. Nenhuma pessoa sã aceitaria um convite para uma armadilha.

Isso é jornalismo.

E é justamente por essa atitude que o canal deles cresce a cada dia. 

É por isso que um programa com muito menos recursos e patrocínios acaba tendo mais audiência que uma emissora consolidada. 

É por isso que Igor 3k e Rica Perrone, de bermuda e camisa de time, são mais jornalistas que William Bonner, de terno e gravata em horário nobre.

Também é por isso que a audiência e o lucro da Globo estão em queda, e milhões de brasileiros, como minha saudosa avó, não respondem mais ao Bonner ao final do Jornal Nacional.

Afinal de contas, a gente só faz questão de dar “boa noite” para quem a gente gosta.

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